“Mulheres são mais friorentas”: Verdade ou mito?
A temperatura do ar condicionado é um tema que pode gerar alguma discórdia, no trabalho ou em casa. Há quase sempre quem tenha calor e quem se queixe do frio. Além disso, é comum afirmar-se que as mulheres são mais friorentas do que os homens. Mas será esta crença popular verdadeira?
É verdade que as mulheres são mais friorentas do que os homens?
“A perceção de temperatura não é linear” e depende de vários fatores, explica Daniela Salazar, endocrinologista na Unidade Local de Saúde da Póvoa de Varzim, Vila do Conde, em declarações ao Viral.
O metabolismo basal, a quantidade de massa muscular e de gordura corporal e a atuação das hormonas são os principais fatores que influenciam a sensação térmica de cada pessoa.
“Os homens têm um metabolismo tendencialmente mais alto”, o que pode levar a que “sintam menos frio”, afirma a endocrinologista.
Mas há outras diferenças estruturais que podem contribuir para uma sensação térmica diferente: as mulheres tendem a ter “uma maior percentagem de gordura corporal” e os homens a apresentar “mais massa muscular” – ambos atuam como “isolante térmico”.
De facto, a testosterona (hormona masculina) está associada a uma maior produção de massa muscular, enquanto o estrogénio (hormona feminina) tem uma ligação à produção de gordura. Este facto poderia justificar a alegação, mas nem sempre é o caso.
Uma mulher que seja atleta e faça exercício físico com regularidade pode ter mais massa muscular do que um homem; e um homem com excesso de peso terá mais gordura do que uma mulher. Por essa razão, não se pode afirmar que a perceção térmica seja sempre uma questão de sexo.
No caso das mulheres, a sensação térmica pode variar ao longo do mês. Daniela Salazar explica que existem “fases do ciclo menstrual que podem alterar a sensibilidade ao frio ou ao calor”, acrescentando que durante a fase lútea – que ocorre após a ovulação – existe “maior tendência para [a mulher] sentir mais frio”. Durante a menstruação, por outro lado, algumas mulheres reportam sentir mais calor.
Também na fase de transição para a menopausa, cerca de 85% das mulheres afirma ter “uma sensação intensa de calor que é difícil de suportar”, sendo acompanhada por “suores intensos”.
Quais as conclusões dos estudos? São robustas?
Existem artigos que identificam uma diferença de perceção de frio entre homens e mulheres, mas os estudos têm poucos participantes e as conclusões não são robustas.
Num estudo, publicado em 2018, analisou-se a que temperatura o grupo – composto por 20 homens e 23 mulheres – começava a tremer. Os investigadores concluíram que as mulheres começavam a tremer aos 11,3 ºC (valor médio), enquanto os homens tremiam quando os termómetros atingiram os 9,6 ºC (valor médio).
Os autores do estudo afirmam que esta experiência “demonstra uma diferença entre os sexos em resposta à exposição ao frio”.
Neste estudo, foram tidos em conta potenciais efeitos de confusão – nomeadamente a existência de diabetes, distúrbios de tiroide, adição a substâncias, gravidez e amamentação ou uso de medicamentos bloqueadores de adrenérgico.
No entanto, é importante sublinhar que o estudo conta apenas com 43 participantes e que não foram considerados níveis de massa muscular e de gordura de cada participantes – apenas se registou o Índice de Massa Corporal (IMC), que relaciona o peso com a altura.
Num outro estudo, também publicado em 2018, foram analisadas as respostas fisiológicas em diferentes ambientes térmicos usando 12 combinações de roupa diferentes. Os investigadores concluíram que “as mulheres são mais sensíveis a um ambiente termal mais frio”.
“Houve diferenças de género nas sensações térmicas no mesmo ambiente frio; no entanto, nenhuma diferença significativa entre os sexos foi encontrada nas sensações térmicas quando homens e mulheres tinham a mesma temperatura da pele medida”, concluem ainda os investigadores.
Neste estudo, os homens tinham um peso médio de 60,7 quilos e uma altura de 1,71 metros, enquanto as mulheres registavam 47,9 quilos e 1,61 metros. Mais uma vez, não foram analisadas as quantidades de massa muscular ou gordura de cada participante.
A nível do metabolismo basal, os homens que participaram neste estudo também apresentam valores médios superiores aos das mulheres. Estes valores podem ter influenciado as conclusões.
É também importante lembrar que ambos os estudos foram feitos em diferentes zonas do globo – o primeiro foi realizado nos Países Baixos e o segundo na China. As populações que vivem em países com temperatura média mais baixa podem ter desenvolvido uma maior resistência ao frio, justificada pela teoria da evolução natural.
Daniela Salazar reforça que “não há evidência que o sexo, por si só, determine uma sensação térmica diferente” e que existem “outros fatores individuais que interferem” nesta comparação. Por essa razão, não se pode afirmar categoricamente que as mulheres sentem mais frio que os homens – pode haver casos que confirmem esta alegação e outros que a contradigam.