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Exercício físico compensa os impactos da obesidade, do tabaco e do colesterol alto?

7 Mai 2024 - 02:41
falso

Exercício físico compensa os impactos da obesidade, do tabaco e do colesterol alto?

Num vídeo partilhado no TikTok e no Instagram alega-se que a prática de exercício físico compensa os efeitos negativos na saúde provocados por certas doenças, como a obesidade e a hipercolesterolemia (colesterol alto), e até pelo tabagismo.

O autor das alegações sugere que “uma mulher obesa que faz exercício vive mais tempo” do que uma mulher normoponderal (com um peso considerado saudável) que não se exercita. 

Além disso, também afirma que “um homem que fuma e tem o colesterol alto, mas faz exercício, vai viver mais tempo do que um homem que não tem esses problemas, mas não pratica exercício”. Mas será que fazer exercício, por si só, compensa os riscos associados a estas doenças e ao tabaco?

Praticar exercício físico compensa os riscos associados à obesidade, ao tabaco e ao colesterol alto?

Em declarações ao Viral, Pedro Carneiro Melo, coordenador de endocrinologia e da Unidade de Obesidade do Instituto CUF Porto, adianta que, ao contrário do que se dá a entender no vídeo partilhado, “o exercício físico deve ser encarado como um complemento e não como uma substituição”, ou seja, não deve ser visto como “o único fator para uma vida saudável”.

Nesse sentido, exemplifica, “se um doente tem o colesterol alto e precisa de medicação, deve fazê-la”. Em simultâneo, “deve ter os cuidados alimentares adequados e fazer exercício”.

Portanto, do ponto de vista do médico, nestes contextos, “não se trata de substituir uma coisa pela outra”, mas, sim, de intervir em várias vertentes.

Claro que, salienta, a prática de exercício físico tem um papel fundamental tanto “na prevenção” como “no tratamento” das condições referidas (obesidade e colesterol alto). 

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Isto é, uma pessoa que não tenha nenhuma dessas doenças e que pratique atividade física “terá menos probabilidade” de as desenvolver e, por outro lado, um doente que “faça exercício reduz o impacto do problema” na saúde.

Por exemplo, refere, uma pessoa com hipertensão conseguirá controlar melhor a condição “se praticar atividade física regular (consoante o tipo de exercício)”. 

Além disso, “em termos do perfil lipídico”, praticar exercício “é uma das formas de elevar o chamado colesterol bom”.

No caso da obesidade, adianta Analiza Silva, professora na Faculdade de Motricidade Humana (FMH) da Universidade de Lisboa e investigadora na área da composição corporal, há evidência que sugere “que apresentar uma boa condição cardiorrespiratória [proporcionada pela prática de exercício] pode atenuar algumas das consequências adversas da obesidade, independentemente de algumas variáveis de confundimento”. 

Além disso, sabe-se que “indivíduos com baixo nível de aptidão cardiorrespiratória apresentavam maior risco de mortalidade, quando comparados com aqueles que apresentavam uma aptidão cardiorrespiratória moderada”, sustenta.

Por esse motivo, “parece que apresentar peso normal pode não ser suficiente já que apresentar uma boa aptidão cardiorrespiratória desempenha um papel muito relevante”. 

Ainda assim, devido às imensas variáveis individuais, não é possível fazer uma comparação geral e direta entre pessoas com obesidade que praticam exercício e pessoas normoponderais (com um peso considerado saudável) que não fazem atividade física. 

Isto porque a aptidão cardiorrespiratória não é o único indicador de saúde, já que uma doença como a obesidade pode gerar outros problemas. Tal como explica a investigadora, “a obesidade está relacionada com múltiplas doenças crónicas”. 

De acordo com um texto informativo publicado no site da Organização Mundial da Saúde (OMS), a obesidade e o excesso de peso levam a “consequências graves para a saúde, como doenças cardiovasculares, diabetes tipo 2, distúrbios musculoesqueléticos e alguns tipos de cancro”.

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No mesmo sentido, num estudo populacional, apesar de se ter demonstrado que os doentes estudados que conseguiram fazer exercício a um nível extremo viveram mais tempo, reconhece-se “que podem existir muitos fatores medidos e não medidos que contribuem para esta associação”.

Por outras palavras, frisa Pedro Carneiro Melo, em teoria, é possível comparar duas pessoas com um quadro clínico semelhante e que estejam inseridas no mesmo contexto. Se uma das pessoas praticar exercício físico com regularidade e a outra não, a pessoa ativa será, à partida, mais saudável

Contudo, do ponto vista dos dois especialistas, não se consegue fazer uma comparação tão geral como a feita no vídeo em análise, por três motivos.

Em primeiro lugar, na perspetiva de Pedro Carneiro Melo, “uma afirmação destas tem de ter uma base científica”, ou seja, tem de ser sustentada por “trabalhos publicados em revistas, jornais ou sites de referência, devidamente avaliados e confrontados do ponto de vista científico, que demonstrem esses benefícios”, o que não acontece neste caso.

Por outro lado, estas são afirmações demasiado gerais para “questões com muita variabilidade”, aponta.

No que diz respeito à obesidade, não se fala do grau (da gravidade) da doença e, no mesmo sentido, quando há referência a “um fumador”, também não se especifica se a pessoa fuma “dez cigarros por dia ou cinco maços”, realça o endocrinologista.

Por último, segundo Pedro Carneiro Melo, é importante perceber que “o exercício físico é benéfico”, mas não deve ser encarado como “uma compensação”.

Esta ideia, sublinha, “pode levar uma pessoa a fazer apenas exercício, em vez de também tomar um antidislipidémico”, por exemplo.

Além disso, a pessoa pode não deixar de fumar, porque acredita que o exercício físico vai compensar o risco associado ao tabaco. Ou, noutro plano, pode fazer com que não se tenha em conta outros fatores importantes no tratamento da obesidade, como “a alimentação”, “o bem-estar psicológico” e “o sono”, destaca Pedro Carneiro Melo.

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No fundo, os especialistas defendem que a prática de exercício físico é fundamental, devendo ser promovida e inserida num estilo de vida saudável. Contudo, não deve ser vista como único indicador de saúde, pois os seus benefícios não se sobrepõem, por si só, aos efeitos negativos da obesidade, do tabaco e do colesterol alto.

Quais os benefícios da prática de exercício físico para a saúde?

Segundo Pedro Carneiro Melo, “o exercício físico é inequivocamente benéfico” e os seus benefícios concretos para cada um vão depender “do tipo de atividade e da idade, da saúde e das limitações da pessoa” que o pratica.

Noutro texto informativo da OMS refere-se que “a inatividade física é um dos principais fatores de risco para mortalidade por doenças não transmissíveis” e, acrescenta-se, “pessoas insuficientemente ativas têm um risco 20% a 30% maior de morte em comparação com pessoas suficientemente ativas”.

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Por outro lado, uma pessoa que pratica atividade física regular pode melhorar “a aptidão muscular”, “cardiorrespiratória” e “a saúde óssea e funcional”, aponta-se no texto.

Além disso, o exercício também pode reduzir “o risco de hipertensão, doença cardíaca coronária, acidente vascular cerebral, diabetes, vários tipos de cancro e depressão”.

A redução do risco de quedas, “bem como de fraturas de quadril ou vertebrais”, e o auxílio na manutenção de um peso corporal saudável são também benefícios mencionados pela OMS.

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7 Mai 2024 - 02:41

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