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Diabetes, cancro e depressão. Quais as doenças associadas à obesidade?

18 Mai 2024 - 09:00

Diabetes, cancro e depressão. Quais as doenças associadas à obesidade?

Os últimos dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) indicam que, “em 2022, uma em cada oito pessoas no mundo vivia com obesidade”, uma doença crónica que constitui um fator de risco para uma série de complicações metabólicas, motoras e psicológicas.

No Dia Nacional da Luta Contra a Obesidade, o psiquiatra e diretor clínico da Casa de Saúde Santa Catarina (CSSC), João Palha, e a endocrinologista, professora na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP) e Presidente da Sociedade Portuguesa de Endocrinologia Diabetes e Metabolismo (SPEDM), Paula Freitas, explicam quais as doenças que estão associadas à obesidade e qual o seu impacto na vida dos doentes.

Que outras doenças estão associadas à obesidade?

Paula Freitas começa por salienta que “a obesidade é uma doença crónica, complexa e multifatorial”, com vários níveis, que pode ter várias causas e que “está associada a múltiplas outras complicações”. 

Segundo a endocrinologista, a evidência científica aponta para a existência de “mais de 200” doenças ligadas à obesidade, sendo que essas complicações podem dividir-se em três categorias: metabólicas, mecânicas e mentais.

Doenças metabólicas

No contexto das complicações metabólicas, Paula Freitas dá alguns exemplos de doenças associadas à obesidade. “A pré-diabetes”, que poderá levar ao desenvolvimento de “diabetes tipo 2”, é um deles.

Tal como se explica um texto informativo publicado no site da SPEDM, “a diabetes tipo 2 é uma consequência comum do excesso de adiposidade” (gordura).

O risco de diabetes “é proporcional à gravidade da obesidade, aumentando exponencialmente com o aumento da gordura abdominal”, salienta-se no mesmo texto.

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Por outro lado, continua Paula Freitas, “o aumento do ácido úrico” e o desenvolvimento de “gota” (uma doença que afeta as articulações), também são descritos como complicações associadas à obesidade.

É de salientar também o aumento do risco de desenvolvimento de “doenças cardiovasculares, como hipertensão arterial, dislipidemia, colesterol alto, doença coronária, AVC (acidente vascular cerebral) e insuficiência cardíaca”, aponta a médica.

No texto da SPEDM explica-se que, “por exemplo, em homens de meia-idade, o risco de morte cardiovascular é duas vezes maior para um IMC (Índice de Massa Corporal) superior a 40 kg/m2 em comparação com homens que apresentam IMC normal”.

Por outro lado, acrescenta-se, “o risco de acidente vascular cerebral isquémico (trombose) é aproximadamente duas vezes maior em indivíduos com IMC superior a 35 kg/m2”.

A relação entre obesidade e hipertensão arterial também está muito bem estudada. No mesmo texto refere-se que cerca de “70% da hipertensão em adultos é atribuída ao excesso ponderal, especialmente a aumento da gordura abdominal”.

Noutro plano, aponta Paula Freitas, a saúde renal também pode estar em perigo. No contexto da obesidade pode-se verificar uma “esteatose hepática (fígado gordo)” que pode evoluir “para esteato-hepatite, para a cirrose, e até mesmo para cancro”, alerta.

Além disso, “a presença de cálculos biliares, problemas de infertilidade (do homem e da mulher) e uma série de cancros” também são comorbilidades da obesidade.

Em relação ao risco de cancro, a OMS destaca, num texto, que alguns dos cancros mais associados à obesidade são: “o cancro do endométrio, da mama, do ovário, da próstata, do fígado, da vesícula biliar, do rim e do cólon”.

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Complicações motoras

Além das várias complicações metabólicas, existe um conjunto de problemas motores associados à obesidade.

Isto deve-se ao facto de ser comum as pessoas com obesidade “terem menos mobilidade”, explica Paula Freitas. 

Nesse sentido, é possível uma pessoa com obesidade ter, “por exemplo, osteoartrose ou osteoartrite [ambas doenças que afetam as articulações] e dores crónicas nos joelhos e na lombar”. 

Por outro lado, a obesidade pode potenciar o desenvolvimento de doenças respiratórias, como “a asma e a apneia de sono”.

Segundo um texto informativo da Associação Médica da Obesidade (OMA, na sigla inglesa), a apneia do sono, em específico, é comum no contexto da obesidade, porque “o excesso de peso aumenta a pressão sobre as vias respiratórias superiores, o que leva ao colapso e à diminuição do controlo neuromuscular dos depósitos de gordura”. 

Por sua vez, acrescenta-se, “isto contribui para a diminuição do volume pulmonar e para o aumento da dificuldade em respirar”. 

Além disso, salienta Paula Freitas, condições como “o refluxo gastroesofágico e a incontinência urinária” também são frequentes em pessoas com obesidade.

Impacto na saúde mental

Tanto Paula Freitas quanto João Palha referem que a obesidade também pode provocar alterações na saúde mental (ver aqui).

Segundo o psiquiatra, a obesidade e doenças como a depressão e ansiedade têm uma relação bidirecional, ou seja, uma é um fator de risco para as outras e vice-versa.

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Isto porque estas doenças “mexem com algumas hormonas importantes que contribuem para o equilíbrio do peso, do humor, da insulina, do cortisol, da fome, etc”, esclarece João Palha.

Por isso, avança, “a depressão, através desta ação nas hormonas, pode influenciar o aumento de peso e, por outro lado, o aumento de peso, através da ação destas hormonas, pode influenciar as perturbações do humor, da depressão e da ansiedade”. 

Além de existir uma “relação do ponto de vista biológico, também pode haver mecanismos mais psicológicos”, frisa. Isto é, explica o médico, “muitas vezes, uma pessoa com obesidade é estigmatizada, discriminada”, levando“a uma autoestima baixa”. 

Nesse contexto, a pessoa “pode isolar-se socialmente e ter uma vida mais sedentária”. Todos estes fatores podem contribuir para “o desenvolvimento de patologia depressiva e ansiosa”, sustenta o psiquiatra.

Qual o impacto destas complicações na saúde de uma pessoa com obesidade?

Nem todas as pessoas com obesidade vão ter as mesmas complicações, até porque existem vários níveis de gravidade da doença (ver aqui). 

Por um lado, refere Paula Freitas, sabe-se “que, à medida que o índice de massa corporal [IMC] aumenta, há uma maior probabilidade de existirem estas complicações”.

Contudo, mais importante do que o IMC, parece ser “a composição corporal”, ou seja, em que partes do corpo está a gordura.

Por exemplo, “uma gordura subcutânea, a nível das ancas e das coxas, não está associada a tantas alterações cardiometabólicas”, mas “pode estar associada a alterações mecânicas, como a dor lombar e nos joelhos”, aponta a presidente da SPEDM.

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Por outro lado, “a gordura visceral, aquela que se acumula mais na cavidade abdominal”, apresenta “maior risco de complicações cardiometabólicas”, incluindo “determinados tipos de cancro”.

Contudo, Paula Freitas considera importante perceber que ter obesidade, e as consequentes complicações associadas à doença, vai potenciar uma “menor qualidade de vida e um risco aumentado de mortalidade”.

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Ainda assim, tratando atempadamente a obesidade (a nível farmacológico, psicológico e, caso necessário, cirúrgico) previne-se o aparecimento das complicações metabólicas, motoras e mentais e, quando já existem, é possível tratá-las.

Paula Freitas avança que, algumas pessoas, “ao perderem 5%, 10%, 15% do peso, podem, por exemplo, deixar de ter hipertensão, estabilizar a diabetes, deixar de ter colesterol alto, melhorar muito a sua insuficiência cardíaca, tratar a apneia do sono”.

É possível reduzir “uma série de doenças e uma série de custos para tratar essas doenças”, garantindo, em simultâneo, que estes doentes têm “qualidade de vida e mais anos de vida”, frisa.

Para isso, idealmente, é necessária uma abordagem multidisciplinar, composta por “um conjunto de profissionais de saúde”, como psicólogos, psiquiatras, endocrinologistas, cirurgiões, nutricionistas e, eventualmente, fisiologistas do exercício.

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18 Mai 2024 - 09:00

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