Mapa 24h vs 48h: evidência atual sobre o melhor método

Mapa 24h vs 48h: evidência atual sobre o melhor método

POR LIMA NOGUEIRA

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A Monitorização Ambulatória da Pressão Arterial (MAPA) é um método de medição da pressão arterial (PA) que consiste na obtenção de várias medições da PA durante o período diurno, mas também noturno. Com isto, obtemos medições no ambiente habitual do doente e conseguimos obter médias de PA diurnas assim como durante a noite, importantes do ponto de vista de valor prognóstico do doente hipertenso [1]. Esta metodologia pode ajudar a distinguir perfis como a hipertensão da bata branca e a hipertensão mascarada, assim como pode fornecer dados sobre a variabilidade da PA que podem ser úteis para a orientação do doente [2].

A MAPA é habitualmente realizada por um período de 24 horas para que se façam registos num ciclo circadiano normal (período de vigília e sono) e foi um método estabelecido nos anos 60, mostrando utilidade e correlação clínica com a morbimortalidade cardiovascular [3]. A tecnologia tem vindo a evoluir, levando a aparelhos automáticos cada vez mais pequenos e práticos. Recentemente, a Sociedade Europeia de Hipertensão publicou um documento de consenso que reforça a importância da metodologia e promove a sua utilização por ser útil e fiável [2]. São conhecidas algumas desvantagens associadas ao método: o preço, o desconforto durante as medições diurnas, a interferência com o sono e a necessidade de respeitar algumas regras de movimento ou de higiene pessoal para que os valores sejam recolhidos na qualidade e quantidade necessárias para que sejam clinicamente úteis [2].

Em Portugal, ficou disponível desde há alguns anos e sobretudo a nível das farmácias comunitárias, o MAPA de 48h, tentando melhorar a acessibilidade ao exame que, até hoje, não tem comparticipação. Esta acessibilidade ficou incluída num serviço pago que visa proporcionar aos profissionais e doentes a realização destes exames de forma relativamente acessível [4]. Contudo, a MAPA de 48h não é um exame padrão para avaliação ambulatória da PA. Apesar de ser um exame que obtém um número maior de medições e pode conseguir, em duas avaliações consecutivas noturnas, avaliar de forma mais concreta o perfil tensional noturno do doente, acarreta maior desconforto para o doente e, na prática, não acrescenta mais ao que se pretende para a gestão do doente [5]. Pelo contrário, a MAPA de 24h acumulou muita evidência relativa à robustez e associação dos seus valores aos eventos maiores cardiovasculares, conhecendo-se bem quais são os valores limite a adotar na prática clínica [6]. A MAPA de 48h tem sido referida como sendo um método superior ao MAPA de 24h, o que não corresponde à verdade: a evidência é alicerçada em estudos com MAPA de 24h (extrapolação) ou num conjunto de trabalhos sempre publicados pelo mesmo grupo científico, carecendo de validação por outros grupos de trabalho [7]. É de notar que há estudos feitos no seguimento da mulher grávida e em doentes dialisados em que foi usada esta metodologia, mas não acumulam robustez (número de doentes ou validação externa) para que possam ser adotados na população que recorre às farmácias para realizar o exame [8].

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As consequências que daqui advêm são várias e geram “ruído” na forma como a informação pode ser integrada na avaliação global do doente. Dado que o exame não é um exame padrão validado para a população geral, os limites de corte para definição e hipertensão arterial podem não ser exatamente os mesmos. Acresce que não é comparável aos valores de 24h, ou seja, uma MAPA de 48h não corresponde à soma de duas de 24h e, por isso, gera um conjunto diferente de médias e valores. Além disso, o fato da evidência limitada não permitir adotar de forma transversal o exame fica patente, pois todas as orientações e guidelines se sustentam na MAPA de 24h [1,9]. É, portanto, um exame alternativo que pode fornecer informação, mas carece sempre de uma validação por um método padrão consensual para tomar decisões e orientar um doente.

Por tudo isto, a MAPA de 48h não é um exame de rotina. Pode ser utilizado para obter informação de rastreio e orientação, mas não substitui as medidas convencionadas de consultório, a AMPA e a MAPA de 24h para orientação do doente hipertenso. São conhecidas as limitações destas metodologias, mas estão bem integradas e conhecidas na evidência científica publicada e são por isso recomendadas pelas sociedades científicas como a Sociedade Portuguesa de Hipertensão e são uma garantia que o melhor é feito, segundo o estado da arte pelos doentes [10].

  1. Mancia, Giuseppe; Kreutz, Reinhold ,et al. 2023 ESH Guidelines for the management of arterial hypertension The Task Force for the management of arterial hypertension of the European Society of Hypertension: Endorsed by the International Society of Hypertension (ISH) and the European Renal Association (ERA). Journal of Hypertension 41(12):p 1874-2071, December 2023. | DOI: 10.1097/HJH.0000000000003480 
  2. Stergiou, George S.; Palatini, Paolo ; Parati, Gianfranco; et al. on behalf of the European Society of Hypertension Council and the European Society of Hypertension Working Group on Blood Pressure Monitoring and Cardiovascular Variability. 2021 European Society of Hypertension practice guidelines for office and out-of-office blood pressure measurement. Journal of Hypertension 39(7):p 1293-1302, July 2021. | DOI: 10.1097/HJH.0000000000002843 
  3. Hinman AT, Engel BT, Bickford AF. Portable blood pressure recorder: accuracy and preliminary use in evaluating intra-daily variations in pressure. Am Heart J. 1962;63:663–668.
  4. www.uah.pt/ – acedido a 8-5-2024
  5. Burgos-Alonso, N., Ruiz Arzalluz, M. V., Garcia-Alvarez, A., Fernandez-Fernandez de Quincoces, D., & Grandes, G. (2021). Reproducibility study of nocturnal blood pressure dipping in patients with high cardiovascular risk. Journal of clinical hypertension (Greenwich, Conn.), 23(5), 1041–1050. https://doi.org/10.1111/jch.14222
  6. Panagiotakos, D., Antza, C., & Kotsis, V. (2024). Ambulatory and home blood pressure monitoring for cardiovascular disease risk evaluation: a systematic review and meta-analysis of prospective cohort studies. Journal of hypertension, 42(1), 1–9. https://doi.org/10.1097/HJH.0000000000003557
  7. Fernández, J. R., Mojón, A., & Hermida, R. C. (2020). Chronotherapy of hypertension: advantages of 48-h ambulatory blood pressure monitoring assessments in MAPEC and Hygia Chronotherapy Trial. Chronobiology international, 37(5), 739–750. https://doi.org/10.1080/07420528.2020.1771355
  8. Vollebregt, K. C., Gisolf, J., Guelen, I., Boer, K., van Montfrans, G., & Wolf, H. (2010). Limited accuracy of the hyperbaric index, ambulatory blood pressure and sphygmomanometry measurements in predicting gestational hypertension and preeclampsia. Journal of hypertension, 28(1), 127–134. https://doi.org/10.1097/HJH.0b013e32833266fc
  9. 2020 International Society of Hypertension Global Hypertension Practice Guidelines, Thomas Unger, Claudio Borghi, Fadi Charchar, Nadia A. Khan, Neil R. Poulter, Dorairaj Prabhakaran, Agustin Ramirez, Markus Schlaich, George S. Stergiou, Maciej Tomaszewski, Richard D. Wainford, Bryan Williams, Aletta E. Schutte
  10. https://www.sphta.org.pt/pt/

Lima Nogueira

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Médico e secretário-adjunto da Sociedade Portuguesa de Hipertensão


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17 Mai 2024 - 02:57

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