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Apneia do sono: O que é? Pode matar? Tem tratamento?

5 Mar 2023 - 09:22

Apneia do sono: O que é? Pode matar? Tem tratamento?

São várias as publicações nas redes sociais que alertam para os riscos da apneia do sono, uma condição que dificulta o principal objetivo de uma noite de sono – o descanso e a recuperação para um novo dia.

Um vídeo publicado no YouTube defende, por exemplo, que a síndrome da apneia do sono “pode ser perigosa”. A autora do vídeo refere, inclusive, que a doença pode levar à morte por alegadamente aumentar o risco de enfarte. Mas será verdade que a apneia do sono pode matar? Esta doença tem tratamento?

O que é a apneia do sono? Quais os riscos? Há tratamento?

apneia do sono

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Contactados pelo Viral, o CEO do Centro Europeu do Sono e diretor da Unidade de Sono do Centro Cardiovascular da Universidade de Lisboa, Miguel Meira e Cruz, o pneumologista e professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), João Carlos Winck, e a médica interna de Medicina Geral e Familiar Ana Isabel de Sousa são unânimes: a apneia do sono é frequente e pode ser grave. 

Importa, antes de mais, esclarecer o que é este problema de saúde. A síndrome de apneia obstrutiva do sono diz respeito a uma “paragem da respiração involuntária e inconsciente durante a noite”, começa por explicar João Carlos Winck.  

Miguel Meira e Cruz adianta que esta paragem respiratória acontece quando “há uma obstrução das vias aéreas superiores, entre o nariz e a região laringo-faríngea”, isto é, entre o nariz e a laringe. 

Na mesma ótica, num texto publicado no balcão digital do SNS descreve-se esta síndrome como “um distúrbio respiratório do sono caracterizado pelo breve, mas frequente bloqueio das vias respiratórias, que provoca interrupções da respiração totais (apneias) ou parciais (hipopneias) durante o sono”. 

Esta síndrome tem “um espectro grande”, aponta o especialista do sono Miguel Meira e Cruz. Existem paragens respiratórias parciais ou totais, que podem ser ligeiras, moderadas ou graves consoante o número de eventos e a sua duração.

Apesar destas variantes, na prática clínica, considera-se síndrome de apneia obstrutiva do sono “quando, no período de uma hora, existe um conjunto mínimo de cinco eventos obstrutivos, com pelo menos 10 segundos cada, em associação a sinais e sintomas de impacto, sobretudo durante o dia, como sucede com a sonolência excessiva”, esclarece Meira e Cruz.

A apneia do sono pode ser fatal?

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Segundo o pneumologista João Carlos Winck, “a apneia por si só não provoca a morte”. Apesar de ser comum pensar-se que quem tem apneia “para de respirar e não acorda mais, isso não é verdade”. Isto porque, quando acontece a apneia, “entram em ação mecanismos de proteção do nosso organismo que nos obrigam a acordar”, explica o também professor da FMUP. 

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O despertar permite que o organismo volte a funcionar normalmente. No entanto, os riscos destas paragens respiratórias frequentes existem e estão associados a complicações cardiovasculares. “Quem tem um problema de apneia grave é como se estivesse a correr a maratona todas as noites sem dar conta”, compara Winck. 

O aumento da pressão arterial, a diminuição dos níveis de oxigénio no sangue ou a aceleração da frequência cardíaca estão entre as consequências destas paragens respiratórias e podem levar ao “aparecimento ou desenvolvimento de problemas cardiovasculares como a hipertensão arterial, a diabetes mellitus, o acidente vascular cerebral (AVC), arritmias ou a insuficiência cardíaca”, elenca-se no site do balcão digital do SNS.

Além da mortalidade associada às complicações cardiovasculares, outra consequência – referida tanto por João Carlos Winck quanto por Ana Isabel de Sousa – é a sonolência

Isto porque as paragens respiratórias durante o sono causam despertares, ainda que leves, e o descanso acaba por não ser reparador. A sonolência pode, assim, ser “um fator de risco para a ocorrência de acidentes de viação ou mesmo de trabalho”, diz a médica.

Na mesma ótica, o professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto descreve que “um motorista, uma pessoa que trabalha nas obras ou até nos comboios tem riscos ocupacionais se adormecer” e, por isso, a apneia do sono “é uma doença que pode provocar um acidente por causa da sonolência”.

É fácil diagnosticar a apneia do sono?

apneia do sono

Quanto ao diagnóstico, Ana Isabel de Sousa sublinha que “a avaliação e a suspeição precoce da SAOS [síndrome de apneia obstrutiva do sono] por parte dos médicos de família é importantíssima para uma referenciação e tratamento atempado da doença” para que seja possível “evitar complicações” cardiovasculares, entre outras.

Esta visão é partilhada por João Carlos Winck que defende que “os médicos deviam, em todas as entrevistas clínicas, perguntar ao doente como dorme, tal como perguntam se come bem ou pelo peso”. 

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“O diagnóstico pode ser tardio, mas não é difícil” aponta o pneumologista. Pode ser feito com a realização de uma polissonografia, um “exame que analisa o sono, nomeadamente a atividade elétrica cerebral, muscular, cardíaca, a respiração incluindo a oxigenação do sangue, a posição corporal e o ressonar”, lê-se na página do SNS24. 

Os três especialistas ouvidos pelo Viral sublinham a necessidade de evitar medicamentos para dormir, com efeito relaxante muscular, por poderem dificultar o diagnóstico desta síndrome.

O pneumologista João Carlos Winck explica que as benzodiazepinas, usadas no tratamento das insónias, “relaxam os músculos da laringe e da língua”, dificultando a normal respiração e o acordar posterior às pausas respiratórias, criando, por isso, “uma falsa sensação de sono pesado e mais profundo”.

Há tratamento para a apneia do sono?

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Considerando que “a obesidade é o principal fator de risco” para a apneia do sono, como descreve a Sociedade Portuguesa de Pneumologia num documento publicado sobre o tema, o tratamento passa, antes de mais, por evitar ou tratar o excesso de peso que dificulta o correto funcionamento do sistema respiratório e cardiovascular.

De acordo com José Carlos Winck, a apneia “acontece com uma grande prevalência nos doentes obesos ou com excesso de peso”, afetando 90% das pessoas com obesidade grave ou mórbida, isto é, “com índices de massa corporal (IMC) acima dos 35 ou 40 Kg/m2”. 

Vários trabalhos científicos mostram, de facto, uma relação entre a obesidade e várias doenças do foro respiratório como a síndrome da apneia do sono.

Os três especialistas ouvidos pelo Viral sobre este tema, bem como a Sociedade Portuguesa de Pneumologia e as informações disponíveis no site do SNS24, são unânimes em relação ao tratamento. Os procedimentos mais comuns e eficazes são os dispositivos de pressão positiva na via aérea (positive air pressure na sigla inglesa, PAP) e os aparelhos intraorais de avanço mandibular, mais conhecidos como goteiras.

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Estas formas de tratamento também são destacadas no documento internacional de consenso sobre apneia obstrutiva do sono, um trabalho que reuniu 17 sociedades científicas, quatro das quais internacionais e 56 especialistas para uma revisão da literatura científica mais recente sobre este tema. “O principal objetivo deste trabalho é proporcionar diretrizes que permitam aos profissionais de saúde tomar as melhores decisões na assistência dos pacientes adultos com esta doença”, escrevem os investigadores.

Questionado acerca do funcionamento do dispositivo de pressão positiva de ar, o pneumologista João Carlos Winck explica que “a apneia acontece ao nível da laringe e da garganta”. Por isso, este aparelho “composto por um dispositivo ventilador e uma máscara que se coloca na cara” vai “criar uma almofada de ar na garganta” e “evita que haja um colapso” das vias aéreas, proporcionando mais qualidade de sono.

Sobre este tratamento, a médica de família Ana Isabel de Sousa defende ser “fundamental que os utentes cumpram o tratamento ventilatório pelo menos seis horas por noite e que tenham uma boa adaptação ao dispositivo”. Para garantir a eficácia do tratamento, a médica interna sublinha ainda a necessidade de uma “avaliação periódica da adesão do doente ao tratamento”.

O aparelho intraoral de avanço mandibular, um tipo de goteira feita por um médico dentista, atua no maxilar inferior e “obriga a pessoa a dormir com o queixo posicionado mais para a frente”. Desta forma, “a língua também vem para a frente e, assim, há mais espaço posteriormente, o que faz com que o paciente não ressone e respire melhor”, conclui João Carlos Winck.

Em suma, a síndrome de apneia obstrutiva do sono é uma das doenças mais importantes no que às doenças do sono diz respeito. A literatura científica estima que afete mais de cinco milhões de portugueses. Como se lê em muitas publicações online sobre o tema, é verdade que, em casos moderados ou graves, pode ter consequências graves.

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Categorias:

Sono

Etiquetas:

Apneia do sono | Sono | tratamento

5 Mar 2023 - 09:22

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