É doloroso? 7 perguntas e respostas sobre a doação de medula óssea
Seja em campanhas promovidas por organismos como o Centro Nacional de Dadores de Medula Óssea (CEDACE), autarquias ou faculdades em prol do registo nacional do dador ou iniciadas por familiares e amigos de doentes que necessitam de encontrar um dador compatível, os apelos à doação de medula óssea são comuns nas redes sociais e chegam, muitas vezes, até aos órgãos de comunicação social.
Ainda assim, persistem algumas dúvidas sobre a forma como decorre o processo, em que consiste a recolha de medula óssea ou a recuperação do dador que podem, eventualmente, refrear a vontade de participar nestas campanhas e integrar a lista do registo de dadores de medula óssea.
O Viral dá a resposta a sete perguntas frequentes sobre este tipo de doação que é fundamental para o tratamento e cura de algumas doenças, não só oncológicas.
O que é a medula óssea?
A medula óssea trata-se de “um tecido esponjoso que preenche o interior de vários ossos”, pode ler-se na página da Associação Portuguesa Contra a Leucemia (APCL), assim como preenche a cavidade esponjosa de vários ossos longos, como, por exemplo, da bacia, do esterno ou da tíbia.
A medula óssea tem duas composições:
- Medula óssea vermelha: É responsável pela produção de células sanguíneas, um processo que se chama de hematopoiese. É aqui que se encontram as stem cells – um termo anglo-saxónico, em português chamam-se células progenitoras/estaminais hematopoiéticas – que têm a capacidade para se diferenciarem em qualquer componente do sangue periférico: glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas.
- Medula óssea amarela: Tem como principal função armazenar gordura. Existem dois tipos de células estaminais na medula óssea amarela – adipócitos e células-tronco mesenquimais – e são elas que preservam a gordura para a produção de energia e para desenvolverem ossos, cartilagens, músculos e células de gordura.
A medula óssea é retirada da coluna vertebral?
É frequente confundir medula óssea com medula espinal, o que pode levantar alguns receios quanto ao procedimento de recolha.
Como já foi acima descrito, a medula óssea é um tecido localizado no interior dos ossos, enquanto a medula espinhal é formada pelo tecido nervoso e está, efetivamente, dentro da coluna vertebral.
A principal função da medula espinhal é transmitir os impulsos do sistema nervoso central (SNC) para as outras partes do corpo que constituem o sistema nervoso periférico (SNP), como os nervos e os gânglios.
Assim sendo, a recolha de medula óssea não é realizada na coluna vertebral, mas sim do interior dos ossos da bacia, e em alguns casos, do esterno ou da tíbia.
A colheita de medula óssea é dolorosa?
Não é considerado um processo doloroso. A medula óssea do dador pode ser colhida de duas formas: por via óssea ou via venosa.
Quando é colhida por via óssea, o dador é anestesiado, submetido a um procedimento no bloco operatório, e não sente dor.
Como é descrito pelo Instituto do Sangue e da Transplantação, “as células são colhidas através de agulhas introduzidas nos ossos da bacia, não há necessidade de fazer fator de crescimento, e o processo demora entre 1 a 2 horas”. Neste caso, “o dador necessita de um internamento de 24 horas”.
Este procedimento é considerado simples e não apresenta riscos significativos “para além da anestesia a que é sujeito, bem como hemorragia e desconforto nos locais de punção, sendo que este último pode durar alguns dias”.
Por via venosa, é utilizado “um processo chamado citaférese, em que se faz a colocação de cateteres em veias, geralmente nos braços, através dos quais o sangue circula por uma máquina que recolhe apenas as células necessárias para o transplante, devolvendo ao dador as restantes células e o plasma”.
Neste método, o dador deve fazer previamente “injeções subcutâneas de um medicamento chamado filgrastim, que é um fator de crescimento, cujo objetivo é fazer com que as células passem da medula óssea para o sangue periférico”.
Segundo o IPST, este processo prévio pode ter como efeitos secundários “dores ósseas e/ou musculares durante os dias de aplicação, mas que não são fortes” e, habitualmente, cedem aos tradicionais analgésicos, não impedindo o dador de trabalhar
Deve apenas evitar esforços físicos, como o treino de ginásio ou práticas desportivas mais intensas.
A decisão sobre qual o tipo de colheita a realizar é determinada pelo dador de acordo com a informação fornecida pelo médico hematologista.
Há um limite de idade para doar medula óssea?
Sim, existe um limite de idade para fazer a doação de medula óssea. Aliás, tal como acontece com a doação de sangue, também para a doação de células da medula existe um conjunto de requisitos para se ser dador e a idade é um dos fatores a ter em conta.
Como esclarece o IPST as principais condições para se inscrever no CEDACE são:
- Ter entre 18 e 45 anos:
- Ter mais de 50 kg;
- Ter uma altura superior a 1,5 metros;
- Não ter recebido transfusões após 1980.
O IPST esclarece ainda que se dá prioridade aos dadores com idades compreendidas entre os 18 e os 35 anos, pois “está clinicamente demonstrado que quanto mais jovem for o dador, maior será a sobrevivência do doente transplantado, porque a medula transplantada será mais capaz de reconstituir o sistema imunitário do doente e terá maior eficácia na prevenção da recaída”, no caso de se tratar de um transplante num doente diagnosticado com uma doença maligna.
Quem tem lúpus pode inscrever-se como dador de medula óssea?
Quem é portador de doenças autoimunes, como o lúpus e a artrite reumatoide, não é candidato a dador de medula óssea.
Existe uma lista de patologias que impedem a doação de medula óssea, da qual também fazem parte a obesidade (mesmo já tendo colocado banda gástrica ou feito bypass gástrico), algumas doenças do foro cardíaco, ter tido um diagnóstico de hepatite B ou C, ter uma doença infectocontagiosa, ser insuficiente renal, ter anemia crónica, diabetes, hérnias discais ou glaucoma.
Para se inscrever no CEDACE é ainda necessário compreender a língua portuguesa, tanto escrita como falada, e ter residência estabelecida em Portugal.
O dador tem apenas de preencher um questionário, sendo que apenas é necessário fazer a inscrição uma única vez.
A qualquer momento, é possível desistir de fazer parte da lista, devendo para isso informar o CEDACE.
Só se pode doar medula óssea uma vez?
Não. Segundo a página do SNS24 e do IPST é possível fazer mais do que uma dádiva já que “a medula é um tecido que se regenera rapidamente” e o dador consegue repor os níveis das células doadas no espaço de semanas.
Não é muito comum o dador ser compatível com mais do que uma pessoa, mas pode acontecer e, se assim o quiser, pode voltar a doar medula óssea para ajudar outro doente a recuperar da patologia que padece.
Dois irmãos podem não ser compatíveis?
É precisamente na família que se inicia a procura por um dador compatível com o doente, nomeadamente entre os irmãos
Todavia, esclarece o IPST, “a probabilidade de 2 irmãos serem compatíveis é de 25%, o que significa que na maioria dos casos não há um dador familiar compatível”, daí a importância dos registos nacionais de dadores de medula óssea.
O mesmo organismo refere que em 70 % dos casos é possível encontrar-se um dador compatível fora da família, devido à colaboração que existe entre os bancos de dadores voluntários semelhantes ao CEDADE espalhados pelo mundo.
A APCL diz que atualmente o universo de dadores abrange “mais de 13.000.000 milhões de pessoas”.
A medula óssea só serve para tratar a leucemia?
O tratamento da maioria dos casos de leucemia, seja aguda ou crónica, beneficia do transplante de medula óssea, mas esses não são os únicos doentes para os quais esta é uma hipótese terapêutica.
Ao todo, são cerca de 80 as doenças que afetam as células do sangue, sejam oncológicas ou não, que podem ser tratadas com o recurso ao transplante de medula óssea.
Entre elas contam-se os linfomas de Hodgkin e não-Hodgkin, as anemias adquiridas ou congénitas – que estão presentes desde o nascimento – e algumas doenças autoimunes.
A lista de patologias que beneficiam deste tratamento coletada pela Mayo Clinic inclui ainda o mieloma múltiplo, o neuroblastoma, síndromes mielodisplásicas, algumas deficiências imunológicas e erros inatos do metabolismo.