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Clean Beauty. Cosméticos naturais são mais eficazes e seguros?

Um cosmético feito à base de ingredientes naturais é mais seguro para a pele, tem menos riscos de desencadear alergias e é melhor para o ambiente? É o que muitos consumidores se perguntam quando são confrontados com as alegações de clean beauty por parte das marcas de dermocosmética. Mas a ciência mostra que os cosméticos naturais são melhores para a saúde do que os convencionais?

29 Set 2022 - 09:15

Clean Beauty. Cosméticos naturais são mais eficazes e seguros?

Um cosmético feito à base de ingredientes naturais é mais seguro para a pele, tem menos riscos de desencadear alergias e é melhor para o ambiente? É o que muitos consumidores se perguntam quando são confrontados com as alegações de clean beauty por parte das marcas de dermocosmética. Mas a ciência mostra que os cosméticos naturais são melhores para a saúde do que os convencionais?

O conceito de clean beauty tem vindo a receber cada vez mais atenção por parte dos consumidores. Por isso, as marcas do setor da beleza têm recorrido com frequência à alegação de que os cosméticos naturais e livres de supostos “ingredientes tóxicos” são mais eficazes, mais seguros para a pele e melhores para o ambiente. Mas estas informações têm base científica?

O que são cosméticos naturais?

Antes de mais, é necessário explicar o que são considerados cosméticos naturais. Quem o garante é Marta Ferreira mestre em Ciências Farmacêuticas e em Tecnologia Farmacêutica, pós-graduada em Cosmetologia Avançada e doutoranda em Ciências Farmacêuticas. 

Em entrevista ao Viral, a autora do “Livro da Pele” começa por realçar “que não existe uma definição regulamentar a nível da União Europeia para aquilo que é um cosmético natural”, o que faz com que esse termo seja “muito contestado” entre os especialistas. 

Afinal, reforça, “um cosmético é, por definição, um produto processado”, acrescentando que, “mesmo quando falamos de produtos que contêm um único ingrediente, como a vaselina, este é altamente processado, já que é esse processamento que dá garantias de qualidade, segurança e eficácia”.

O que existe, atualmente, são certificações com as diretrizes para produção de cosméticos – como a ISO e a COSMO – nas quais se define as chamadas “linhas de corte” em que produtos compostos por 90% ou 95% de ingredientes de origem natural podem ser catalogados como produto natural. Contudo, sublinha Marta Ferreira, “os conceitos de segurança, eficácia e sustentabilidade estão dissociados dos conceitos de natural e sintético e a avaliação deve ser feita caso a caso”. 

Cosméticos naturais são mais eficazes e seguros?

Os dermatologistas Bruce Brod e Courtney Blair publicaram um artigo na revista JAMA Dermatology em que argumentam que “uma designação arbitrária de limpo ou natural não torna necessariamente os produtos mais seguros para os consumidores”. 

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Aliás, Brod e Blair referem no texto que “muitos dos chamados produtos naturais contêm altas concentrações de extratos botânicos que são uma das principais causas de dermatite de contacto irritante e alérgica e de fotossensibilização”. Por isso, alertam os especialistas para a necessidade de explicarem aos seus utentes “que natural é um termo de marketing, que não significa necessariamente mais seguro ou mais eficaz”.

Nesse sentido, Marta Ferreira dá como exemplo os parabenos para explicar como o rótulo natural nem sempre é bom e o sintético não tem de ser, necessariamente, perigoso.

Há 16 anos, a segurança dos parabenos – um grupo de ingredientes sintéticos com propriedades conservantes utilizados em diferentes tipos de cosméticos e produtos de higiene pessoal – começou a ser questionada pela “semelhança estrutural com as hormonas estrogénicas, embora sejam muitíssimo menos potentes”.  Ora, atualmente, o Comité Científico de Segurança do Consumidor (SCCS) da Comissão Europeia permite a utilização de quatro tipos de parabenos, pois “os estudos sucessivos de que dispomos não nos permitem afirmar que haja um risco real [da utilização de parabenos], apenas um risco hipotético”, explica a farmacêutica.

No entanto, o alarmismo criado na sociedade levou a uma demanda dos consumidores pela substituição destes ingredientes por outros conservantes, sendo que estes substitutos revelaram ter um maior potencial alérgico. 

“A demonização de ingredientes [sintéticos] não tem qualquer fundamento e pode ter efeitos contraproducentes”, comenta Marta Ferreira. Até porque, acrescenta, no espaço europeu a segurança dos produtos cosméticos está regulamentada, assim como a eficácia das alegações, com o SCCS a determinar a lista de ingredientes proibidos e os que só podem ser utilizados em determinados produtos e circunstâncias, o que faz com que todos os produtos legalizados que entrem no mercado sejam considerados seguros.

Por outro lado, a farmacêutica lembra que os óleos essenciais têm “grande fama” por serem considerados e publicitados como produtos naturais, mas que “são muito ricos em compostos alergénios”, não podendo ser considerados, necessariamente, mais seguros.

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E tal como no caso da segurança e da eficácia, estes ingredientes vegetais considerados naturais também devem ser avaliados quanto à pegada ambiental. O argumento da sustentabilidade cai por terra quando “é preciso plantar hectares e hectares de lavanda para produzir óleo essencial de lavanda”, lembra Marta Ferreira, com tudo o que implica em termos de consumíveis, como água ou eletricidade.

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O mesmo se aplica a ingredientes minerais como a mica, usado em produtos pigmentados na maquilhagem, cuja exploração tem estado associada à utilização de trabalho infantil.

Pela evidência científica até agora produzida, quando encontramos um produto com um “atestado de natural não devemos logo acreditar que seja bom” já que, como reforça Marta Ferreira, “a alegação de naturalidade não é um sinónimo nem de eficácia, nem de segurança, nem de sustentabilidade”.

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Dermatologia

29 Set 2022 - 09:15

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