No TikTok, circulam vídeos em que se alega que “beber água com limão previne pedras nos rins”. 

Segundo o autor de uma das publicações, “o ácido cítrico do sumo de limão liga-se ao oxalato” (um antinutriente). Como “o tipo mais comum de pedras nos rins são as pedras de oxalato de cálcio, se tivermos citrato no nosso corpo, este pode ligar-se aos oxalatos para evitar a formação de cálculos”, alega-se. Mas terão estas alegações fundamento? Beber água com limão, por si só, previne as pedras nos rins?

É verdade que beber água com limão, por si só, previne as pedras nos rins?

Em declarações ao Viral, Luís Coentrão, nefrologista no serviço de medicina intensiva do Centro Hospitalar de São João (CHSJ) e membro da direção da Sociedade Portuguesa de Nefrologia (SPN), explica que “não existe evidência científica de que o sumo de limão, ou de outras frutas cítricas, por si só, previna as pedras nos rins”.

De facto, aponta o médico, há “um fundo de verdade, em termos bioquímicos”, nestas alegações. Isto é, em teoria, “o ácido cítrico [ou citrato] presente nos limões e nas laranjas, por exemplo, pode ter um potencial efeito benéfico na prevenção de pedras nos rins”, admite.

Como se explica num texto informativo publicado pela Escola de Saúde Pública de Harvard, “as pedras nos rins formam-se quando certas substâncias, como o cálcio, o oxalato ou o ácido úrico, ficam concentradas o suficiente para formar cristais nos rins”. E, segundo Luís Coentrão, “as pedras de oxalato de cálcio são as mais comuns”. 

Numa revisão narrativa recente, explica-se que “o teor de citrato” do sumo das frutas cítricas, como o limão, tem o potencial de inibir a formação e a aglomeração de pedras renais de oxalato de cálcio (também se verificou este potencial efeito benéfico neste estudo, neste, neste e neste).

Por outro lado, segundo a mesma revisão, sabe-se também que os sumos de citrinos, apesar de serem “ácidos por definição”, têm um “efeito alcalinizante no pH da urina” (ou seja, diminuem a sua acidez). 

Esta ação tem “um papel particularmente importante contra a formação de cálculos de oxalato de cálcio e ácido úrico”, salienta-se.

Por último, o teor de fibra dos citrinos também parece contribuir para o efeito protetor dessas frutas na prevenção de pedras nos rins.

Contudo, explica-se na mesma revisão, “embora todos os citrinos sejam uma fonte particularmente rica de citrato”, continua a registar-se uma “diferença no seu efeito protetor contra a formação de cálculos urinários”.

Isto pode dever-se ao facto de a quantidade de citrato presente nestas frutas não ser sempre a mesma. 

Além disso, “o teor de citrato nestes frutos não se traduz automaticamente no aumento esperado do citrato urinário”, frisa-se. 

No mesmo sentido, os investigadores também verificaram que “nem todos os sumos de citrinos têm o mesmo efeito alcalinizante da urina”. 

Para mais, “os citrinos também têm cargas variáveis de potássio, cálcio e oxalato, o que pode anular os efeitos positivos do aumento do citrato urinário e da alcalinização da urina”.

Por fim, referem os autores do estudo, também se deve ter em conta que, além de os citrinos serem ricos em frutose, muitas vezes, as limonadas e os sumos de laranja têm açúcar adicionado.

Nesse sentido, o consumo elevado de açúcar acaba por ser contraproducente, já que pode levar a um excesso de cálcio na urina que, por consequência, pode causar pedras nos rins.

Ainda assim, aponta Luís Coentrão, “não há evidência de que beber água com limão faça mal aos rins, desde que seja em doses moderadas”.

Aliás, prossegue, à partida, esta bebida “pode até ter um efeito protetor, nem que seja porque contribui para o aumento de ingestão de água”.

No entanto, não há estudos disponíveis que permitam dizer que beber água com limão “seja benéfico para todas as pessoas, nem que previna, por si só, as pedras nos rins”, remata o especialista.

Importa sublinhar que todos os estudos referidos apontam um potencial efeito protetor dos frutos cítricos no desenvolvimento de pedras nos rins, mas também admitem ser necessária evidência mais robusta.

Por isso, considera-se exagerado afirmar que beber água com limão previne as pedras nos rins, já que a evidência disponível só permite concluir que o sumo dos citrinos tem apenas um potencial (e não garantido) efeito benéfico na prevenção de cálculos renais.

Como prevenir o aparecimento de pedras nos rins?

Não há uma medida que, por si só, vá ser 100% eficaz na prevenção de pedras nos rins. Existe, sim, um conjunto de recomendações que podem diminuir o risco de desenvolvimentos de cálculos.

Em primeiro lugar, salienta-se a importância da ingestão adequada de água. Organizações internacionais de saúde, como o Sistema Nacional de Saúde britânico, o Instituto Nacional de Diabetes e Doenças Digestivas e Renais (NIDDK, na sigla inglesa) dos Estados Unidos e a Fundação Nacional do Rim dos Estados Unidos, defendem que manter uma hidratação adequada é a medida mais importante a tomar na prevenção de pedras dos rins.

Além disso, é importante ter uma dieta com pouco sal, visto que o excesso de consumo de sódio pode provocar pedras nos rins (ver aqui, aqui, aqui e aqui).

Para mais, refere Luís Coentrão, recomenda-se que as pessoas com tendência para terem pedras nos rins não ultrapassem o limite diário estabelecido para a ingestão de proteína. 

Isto porque “os rins também são importantes na eliminação de toxinas” e “um dos problemas das pessoas com doença renal é não conseguirem eliminar as toxinas que ingerem”.

Por outro lado, aponta-se no texto da Escola de Saúde Pública de Harvard, deve-se comer “alimentos ricos em cálcio”, porque ajudam na “diminuição do risco de pedras nos rins” (ver também aqui).

Podem ser também necessárias outras alterações na dieta que, segundo um texto do NIDDK, vão depender do tipo de pedras renais que a pessoa tem ou costuma ter. No entanto destaca-se, todas essas alterações devem ser discutidas com um profissional de saúde.

Caso um doente esteja a fazer medicação no contexto de doença renal, é igualmente importante não deixar de fazer esse tratamento sem recomendação de um médico.

Noutro plano, alguns estudos sugerem que a toma de doses altas de suplementos de vitamina C aumentam o risco de se desenvolver pedras nos rins (ver aqui e aqui).

Por fim, deixar de fumar e restringir o consumo de refrigerantes e outras bebidas açucaradas são também medidas importantes na prevenção de pedras nos rins.