Chá de mel e canela reduz o colesterol?
O chá de mel e canela é apresentado nas redes sociais como um “potente remédio natural quase milagroso” para tratar doenças.
Segundo o autor de uma publicação partilhada no Facebook, misturar duas colheres de mel e três colheres de canela numa chávena com água quente e ingerir essa bebida leva à redução do colesterol em “pouco tempo”.
Além da suposta redução do colesterol, há mais 19 alegados benefícios deste chá apresentados na publicação. No entanto, o autor alerta que as pessoas com hipertensão devem evitar o consumo de canela.
É também dito nas redes sociais que a mistura de mel e canela cura a “maioria das doenças”. No caso do colesterol, é dito que o reduz “em 10% em duas horas”. Para esse fim, alega-se, o chá deve ser bebido três vezes por dia. Mas estas alegações têm fundamento?
É verdade que o chá de mel e canela reduz o colesterol?
Quando questionada se o chá de mel e canela reduz o colesterol, Sónia dos Santos, nutricionista da clínica Ana Silva Guerra, responde prontamente: “Não, de maneira nenhuma, é um mito”. A nutricionista diz desconhecer estudos que o comprovem.
No mesmo sentido, o cardiologista José Pedro Sousa, do Instituto Português de Oncologia do Porto Francisco Gentil e membro da Sociedade Portuguesa de Cardiologia, reconhece que há “alguma evidência científica” sobre o impacto dos componentes deste chá na “ficha lipídica, grupo de análise sanguíneas referentes ao teor em gordura, de que o colesterol faz parte”. No entanto, esta evidência é “limitada e imprecisa”.
O mel já foi associado a uma “redução dos níveis sanguíneos de colesterol total, colesterol LDL e triglicerídeos”, explica. Contudo, a sua composição inclui uma grande quantidade de açúcar e já foi associado a “parâmetros sanguíneos de inflamação”.
A canela tem ainda “evidência de menor qualidade”, aponta José Pedro Sousa.
Para a nutricionista consultada pelo Viral, o efeito termogénico da canela, que eleva a temperatura do corpo, pode ter estado na origem do mito de que reduz o colesterol.
O membro da Sociedade Portuguesa de Cardiologia reforça que “não existem dados” que permitam estabelecer um “nexo de causalidade robusto” entre o consumo de mel e canela com o colesterol.
Nenhuma das três grandes sociedades científicas cardiológicas internacionais – European Society of Cardiology, American College of Cardiology e American Heart Association – recomendam a ingestão do chá para a redução do colesterol, aponta o cardiologista.
O que é o colesterol?
De acordo com Serviço Nacional de Saúde do Reino Unido, o colesterol é um lípido (gordura) “transportado no sangue por moléculas”. Por norma, é testado através de análises ao sangue.
No mesmo sentido, José Pedro Sousa especifica que o colesterol é um “composto orgânico seroso” e tem duas origens diferentes: uma – a principal – tem que ver com a “sua síntese intrínseca, endógena, pelo fígado”, e a outra está relacionada com a dieta alimentar.
A nutricionista da clínica Ana Silva Guerra refere que “é importante” termos colesterol. “Não devemos demonizar”, afirma.
Esta ideia é também partilhada pelo cardiologista consultado pelo Viral, que explica que o colesterol “não é inerentemente mau”. Aliás, é “indispensável à vida”, sendo utilizado pelo organismo para “dotar as membranas celulares de fluidez e para a síntese de determinadas vitaminas (como a D) e hormonas (como o cortisol e as sexuais)”.
O médico pormenoriza que há dois tipos de colesterol: o LDL (conhecido como mau colesterol) e o HDL (conhecido como bom colesterol).
Enquanto o HDL encaminha o colesterol para o fígado para ser eliminado, o LDL pode associar-se a outras substâncias e células circulantes e depositar-se nas artérias do organismo, sobretudo nas que se circunscrevem ao coração e cérebro, explica.
Devemos preocupar-nos quando o colesterol está “muito alto”, quando se tem um problema de saúde e há produção excessiva, sugere Sónia dos Santos. Nesse caso, pode provocar, por exemplo, problemas cardiovasculares.
Antes achava-se que o colesterol estava “muito ligado à alimentação”, uma ideia que nos dias de hoje perdeu força. Há “outros fatores, como a genética” que contribuem para os níveis de colesterol no sangue.
O colesterol, “uma gordura vista como prejudicial”, só “ameaça a boa saúde do sistema cardiovascular” se se encontrar em “níveis elevados”, indica a Fundação Portuguesa de Cardiologia.
“[O colesterol] é fundamental para a produção de vitamina D, que aumenta a absorção intestinal de cálcio e intervém na regulação do humor, de ácidos biliares, que auxiliam a digestão, e na produção de diversas hormonas”, refere a mesma fonte, acrescentando que tem também uma importante função estrutural.
A fundação diz ainda que o “problema” começa quando os níveis de colesterol estão elevados.
Os níveis de colesterol LDL acima do normal, diz José Pedro Sousa, sobretudo com um estilo de vida não saudável, podem originar enfartes agudos do miocárdio e acidentes vasculares cerebrais.
O médico salienta que há um “elevado grau de evidência científica” da influência do estilo de vida na “redução das colesterolemia total e LDL”.
Sónia dos Santos aponta que o colesterol alto pode estar associado a baixa vitamina D: “Quando a vitamina D não é estimulada, vai haver mais colesterol. Não é transversal, mas acontece a grande parte das pessoas”.
A atividade física diária, como caminhar durante 30 minutos, e a vitamina D são essenciais em caso de colesterol alto, refere a nutricionista.
No que diz respeito à alimentação, indica Sónia dos Santos, as pessoas com colesterol alto devem evitar fontes de gordura saturadas, aumentar o consumo de vegetais e diminuir o consumo de proteína animal. A nutricionista recomenda uma alimentação 80% vegetal e 20% de peixe ou carne (de preferência, magra).
Também o cardiologista refere que o consumo de alimentos ricos em gorduras trans e saturadas deve ser evitado, enquanto a aposta deve ser em “produtos fartos em fibra alimentar, alimentos enriquecidos com fitosteróis”.
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