Curcuma, limão e gengibre são os principais ingredientes dos chamados “shots de imunidade”. Estas bebidas concentradas tornaram-se uma tendência nas redes sociais – como o Twitter, o Facebook, o Instagram e o TikTok – e hoje são um hábito diário de vários criadores de conteúdos e respetivos seguidores.
Segundo as publicações detetadas pelo Viral, esta mistura deve ser consumida em jejum e, supostamente, fortalece a imunidade, prevenindo várias doenças.
“Os shots são doses concentradas de nutrientes para ajudar a sua saúde. Você pode consumir em jejum, e alternar os ingredientes para não enjoar e para diversificar os nutrientes e benefícios. Já utiliza os shots na sua rotina? Com quais ingredientes você costuma fazer o seu shot?”, lê-se na descrição de um vídeo.
Mas será mesmo assim? Estas alegações sobre os “shots de imunidade” têm fundamento científico ou são apenas um mito?
É verdade que os chamados “shots de imunidade” reforçam o sistema imunitário?
Rosário Monteiro, professora da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP), explica ao Viral que “as conclusões acerca dos benefícios de uma dada intervenção na saúde devem ser provenientes de ensaios clínicos bem desenhados, com dados confirmados em investigações independentes.”
Nesse sentido, completa, “não existem, atualmente, ensaios clínicos que evidenciem que as misturas aqui denominadas como ‘shots de imunidade’ (contendo curcuma, limão e gengibre) se associem a uma estimulação do sistema imunitário”.
Ainda assim, enquanto alimentos individuais, não deixam de ser considerados saudáveis. “O gengibre pode ter algum potencial na redução das náuseas e inflamação. O limão tem vitamina C, mas nas quantidades usadas nesses shots ela será quase irrelevante. E a curcuma até pode ter alguns efeitos positivos na diminuição de triglicerídeos, inflamação, dor e pressão arterial, mas a sua absorção é tremendamente fraca”, esclarece o nutricionista Pedro Carvalho.
No mesmo plano, Rosário Monteiro refere existirem “dados de investigações básicas, laboratoriais, que associam os componentes isolados a efeitos imunomoduladores, mas os dados obtidos neste tipo de investigação não são adequados para gerar recomendações de intervenção”.
Assim, conclui, “é impossível afirmar se poderão trazer benefícios para a saúde, a frequência adequada para o seu consumo, a forma de preparação, os seus efeitos indesejáveis ou adversos, ou a dose máxima diária a consumir”.
A opinião dos dois especialistas em relação a estes shots é unânime: o efeito da bebida não foi testado, por isso, não há dados científicos que comprovem a sua eficácia.
Pedro Carvalho até classifica os benefícios como “muito marginais”. “Não se pode dizer que não existem [benefícios], pois são três alimentos que se podem considerar saudáveis, mas sem um efeito mágico no que à imunidade diz respeito. Só utilizando alguns suplementos de curcuma associados a pimenta preta ou noutras formulações patenteadas onde se observa uma melhoria da sua absorção é que é possível observar esses efeitos. Juntar o pó num shot de imunidade é apenas show-off”, aponta o especialista em nutrição.
Assim sendo, Rosário Monteiro é da opinião que “até à existência de investigações adequadas nesse sentido, não há evidência científica que apoie a recomendação do consumo das referidas misturas como estimuladores de imunidade ou com o intuito de proteger em relação a patologias, ou de melhorar o seu curso”.
Beber os supostos “shots de imunidade” pode ser prejudicial para a saúde?
O consumo destes shots de imunidade “em quantidades além das que podem ser enquadráveis numa alimentação equilibrada, ou seja, em doses farmacológicas, poderá não ser desprovido de toxicidade, pelo que deve ser desaconselhado”, garante a professora Rosário Monteiro.
Pedro Carvalho destaca que este tipo de tendência revela-se um desperdício de dinheiro e faz com que as pessoas criem expectativas inalcançáveis em relação à bebida.
Além disso, acrescenta, “as pessoas que promovem este tipo de práticas não são pessoas sérias e que pautam a sua atividade pelas melhores práticas baseadas na evidência científica”.
Assim sendo, conclui, “além destas, poderão existir muitas outras recomendações alimentares e nutricionais que não são de todo necessárias e que podem inclusive estar mascaradas de publicidade a algum produto comercial”.
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