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Sumo de arando previne e trata infeções urinárias?

A prática de beber sumo de arando previne e trata infeções urinárias? A ginecologista e obstetra, Irina Ramilo, e a presidente da secção de Uroginecologia da Sociedade Portuguesa de Ginecologia, Bercina Candoso, esclarecem o que se sabe sobre a questão.

16 Jan 2023 - 10:09
impreciso

Sumo de arando previne e trata infeções urinárias?

A prática de beber sumo de arando previne e trata infeções urinárias? A ginecologista e obstetra, Irina Ramilo, e a presidente da secção de Uroginecologia da Sociedade Portuguesa de Ginecologia, Bercina Candoso, esclarecem o que se sabe sobre a questão.

Segundo a sabedoria popular – e várias alegações partilhadas nas redes sociais – o sumo de arando previne e trata infeções urinárias. Disponível em ervanárias, em lojas de produtos naturais e em supermercados, a bebida feita de arando vermelho (cranberry, em inglês) ganhou popularidade entre quem sofre recorrentemente com a dor e o desconforto provocados por uma infeção urinária. Mas existe evidência científica que sustente esta ideia?

É verdade que o sumo de arando previne e trata infeções urinárias?

Não há provas suficientes para garantir que o sumo de arando previne e trata infeções urinárias. Quem o esclarece ao Viral é a ginecologista, obstetra e criadora de conteúdos digitais através da sua página de Instagram, Irina Ramilo, e a responsável pelo Centro de Uroginecologia e Pavimento Pélvico do Centro Hospitalar Universitário do Porto (CHUPorto) e presidente da secção de Uroginecologia da Sociedade Portuguesa de Ginecologia (SPG), Bercina Candoso.

Irina Ramilo começa por explicar que, historicamente, “o arando vermelho tem sido usado para o tratamento e prevenção de infeções do trato urinário (ITU)”. No entanto, não há consenso científico em torno desta questão.

Na perspetiva da especialista em ginecologia e obstetrícia, Bercina Candoso, beber “sumo de arando será muito pouco eficaz a reduzir os episódios de infeção urinária, visto que a concentração é muito menor do que nos concentrados vendidos pela indústria farmacêutica”.

Segundo a médica, poderá ser viável “aconselhar os pacientes sobre o uso de produtos de arando para reduzir os episódios recorrentes de ITU”. Contudo, acrescenta, “os pacientes devem ser informados de que a qualidade das evidências que sustentam isso é baixa e com achados contraditórios”.

A título de exemplo, Irina Ramilo refere uma meta-análise em que se concluiu que os produtos de arando reduziram o risco de infeções do trato urinário em 26% das mulheres. De facto, “esses dados sugerem que os produtos de arando vermelhos podem ser eficazes na prevenção de ITUs em mulheres”.

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Contudo, “esses resultados não devem ser considerados definitivos e são necessários mais ensaios clínicos para confirmar esses achados”, assegura a mesma fonte. O grande problema é que “o seu mecanismo de ação [do fruto] ainda é desconhecido”, alerta.

Além do sumo, o arando como suplemento dietético também está disponível em comprimidos

Trabalhos que estudam tanto o sumo como os suplementos em cápsulas “demonstram uma redução na recorrência de ITUs, embora apenas o subgrupo com comprimidos tenha apresentado uma redução estatisticamente significativa”.

No entanto, “até agora, a maioria dos ensaios clínicos falharam em demonstrar a sua eficácia indiscutível para a prevenção e tratamento de infeções urinárias”, salienta a médica.

Isto deve-se, na visão da especialista, “à falta de dados estatísticos significativos, à baixa reprodutibilidade dos produtos à base de arando usados ​​e sua dosagem e à duração da intervenção e desenho experimental”.

Noutro plano, “a Cochrane (organização que responde à necessidade de organizar de forma sistemática os resultados de investigação em medicina) concentrou-se nas evidências dos produtos de arando para a profilaxia de ITU desde 1998, com atualizações em 2004, 2008 e 2012″, aponta Irina Ramilo. 

Na revisão mais recente, a Cochrane, “mostrou que os produtos de arando não reduziram significativamente o risco de ITU sintomática repetida”.

Logo, por falta de consenso, não se pode dizer que o sumo de arando trate, por si só, as infeções do trato urinário.

Infeções urinárias: como surgem, cuidados a ter e tratamento 

Como explica a ginecologista Irina Ramilo, “as infeções do trato urinário são bastantes comuns, principalmente em mulheres jovens e saudáveis”, sendo que boa parte delas são provocadas pela contaminação do intestino ou através de relações sexuais. 

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Aliás, destaca a médica, “a causa mais frequente das desta doença é a infeção através da bactéria E. Coli“.

Por um lado, explica a ginecologista do CHUPorto, as ITU podem ser frequentes na juventude pela “presumível atividade sexual mais intensa, que facilita o transporte desses agentes”.

Por outro lado, “na menopausa, a atrofia permite que o meato uretral esteja mais aberto, por isso, também facilita a ascensão de agentes para dentro da bexiga”, sustenta.

Além disso, existem outros fatores que poderão facilitar o desenvolvimento das infeções urinárias, tais como a falta de higiene, a pouca ingestão de líquidos, a presença de prolapso da bexiga e a diabetes

Por último, acrescenta, “indivíduos que usem espermicidas, tenham histórico familiar de infeção urinária ou esvaziamento incompleto da bexiga e tenham trato urinário inferior disfuncional ou reconstruído também veem aumentada a prevalência” de ITU. 

E quais os sintomas desta doença? A sintomatologia de uma infeção urinária é muito díspar. Vai desde “polaquiúria (micções frequentes e em pequena quantidade), disúria (ardor ao urinar), vontade urgente e constante de urinar, urina com cheiro fétido, sangue na urina ou dor na parte inferior do abdómen”, refere Irina Ramilo.

Para prevenir este tipo de infeções, Bercina Candoso recomenda que se tenha “hábitos de higiene corretos”. Mas como? “Lavar-se sempre da frente para trás, ingerir cerca de 1,5 litros de água por dia, tratar a atrofia vaginal, tratar os prolapsos e urinar sempre após as relações sexuais”.

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A “antibioterapia” (a toma de antibióticos) é o tratamento disponível para as ITU, aponta Irina Ramilo. A ginecologista esclarece que este processo deve ser “adaptado ao teste de sensibilidade dos antibióticos da infeção específica”. 

Além disso, durante o tratamento, deve-se manter todos os cuidados recomendados na prevenção. Segundo a mesma fonte, “é aconselhado um bom restabelecimento da flora intestinal, um bom funcionamento da parte gastrointestinal, cuidados de higiene após evacuação e após relações sexuais, a utilização de roupa íntima não sintética e a hidratação”. 

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Ginecologia

16 Jan 2023 - 10:09

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