Não há “nenhuma razão para remover os dentes do siso”?
Num vídeo partilhado no Instagram alega-se que “não há nenhuma razão para remover os dentes do siso”. Segundo o autor do post, os dentes do siso “são linhas meridianas” conectadas “ao cérebro” e “ao coração”.
Por isso, defende, como “é um procedimento que não era suposto acontecer”, muitas vezes, “quando as pessoas removem os dentes do siso, começam a desenvolver problemas cardíacos”. Mas será mesmo assim? Nunca se deve remover os dentes do siso porque fazê-lo mexe com as “linhas meridianas”, causando problemas cardíacos?
Nunca se deve remover os dentes do siso?
Em esclarecimentos ao Viral, a dentista Ana Sousa adianta que não é verdade que os dentes do siso nunca devem ser removidos. Aliás, salienta, “há inúmeras razões pelas quais pode ser necessária a exodontia de um dente do siso”.
Por exemplo, refere, “caso o dente se encontre incluso (dentro do osso) ou semi-incluso (parcialmente erupcionado) deve ser extraído”.
Além disso, “a má posição e falta de espaço na arcada dentária, ou a presença de cárie dentária, ou inflamação gengival, constituem outros motivos pelos quais se deve proceder à sua extração”, prossegue.
Caso haja “infeção associada (pericoronarite)”, a remoção “também é indicada”, destaca a especialista.
É ainda importante realçar que “se houver indicação para a extração dos dentes do siso e esta não for realizada há alguns riscos associados”.
Tal como explica Ana Sousa, “se estivermos perante uma má posição do dente na arcada, o doente vai ter dificuldades em manter uma correta higiene oral, sobretudo desse dente”.
Isso “poderá facilitar o aparecimento de cárie dentária e de gengivite localizada ao dente do siso em questão”, justifica.
Noutro plano, “caso haja alguma infeção no dente do siso não tratada, esta vai afetar a saúde sistémica do indivíduo”.
No vídeo em análise sugere-se ainda que os dentes do siso “são linhas meridianas” e removê-los “causa problemas cardíacos”. No entanto, há várias imprecisões nessas afirmações.
Em primeiro lugar, Ana Sousa esclarece que, “por definição, as linhas meridianas são linhas imaginárias horizontais sobre o globo terrestre, perpendiculares à Linha do Equador, que formam semicírculos e se unem nos polos”.
Na saúde, “as ‘linhas meridianas’ são um conceito que apenas se encontra na Medicina Tradicional Chinesa, usadas nomeadamente na acupuntura e sem relação com os dentes do siso”, salienta.
Noutro plano, de facto, “a ligação da saúde oral à saúde cardiovascular tem sido estudada e está comprovada cientificamente”, refere Ana Sousa.
Segundo a dentista, “certas bactérias que se encontram na cavidade oral podem atingir a corrente sanguínea e chegar a várias áreas do corpo humano”.
Quando estas bactérias “entram no sistema cardiovascular podem causar inflamação do endocárdio (uma membrana de revestimento do coração), levando ao aparecimento de endocardites infeciosas” (ver também aqui e aqui).
Segundo a American Heart Association, adianta Ana Sousa, “outros problemas cardiovasculares como a aterosclerose e os acidentes vasculares cerebrais, podem ter origem em bactérias da flora oral” (ver aqui).
Os “pacientes com gengivite ou doença periodontal têm uma maior propensão a desenvolver este tipo de problemas”, alerta.
Nesse sentido, “a não extração, quando indicada, dos dentes do siso também pode levar ao aparecimento de problemas cardíacos, nomeadamente em casos de infeções não tratadas ou de doença periodontal”, conclui.
Noutro plano, também se sabe que pode existir um risco cardíaco associado à remoção dos dentes do siso, mas esse risco vai depender sobretudo dos cuidados que se tem após o procedimento.
“A extração dos dentes do siso pode provocar problemas cardíacos caso haja alguma complicação pós-operatória, nomeadamente a alveolite seca que corresponde à infeção do alvéolo dentário”, explica Ana Sousa.
Com o desenvolvimento desta infeção, “as bactérias podem entrar na corrente sanguínea e provocar uma endocardite infeciosa”, acrescenta.
Por esta razão, “é de extrema importância que todos os cuidados pós-operatórios sejam esclarecidos e cumpridos”.
Caso se verifique o “desenvolvimento de uma alveolite, deverá dirigir-se a um médico dentista, para poder ser tratada devidamente”, aconselha.
Nem sempre é necessário remover os dentes do siso
Tal como há motivos que levam à recomendação da extração dos dentes do siso, também há contextos em que não é necessário removê-los.
“Os dentes do siso saudáveis e que tenham espaço para erupcionar corretamente nas arcadas dentárias, não têm indicação para serem extraídos”, aponta Ana Sousa.
Contudo, defende, “cada caso deve ser avaliado individualmente por um médico dentista”.