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Alimentação

O glúten não é prejudicial para quem não tem doença celíaca ou sensibilidade

7 Abr 2022 - 11:22

Alimentação

O glúten não é prejudicial para quem não tem doença celíaca ou sensibilidade

Nos últimos anos, o termo “glúten free” (sem glúten, em português) tornou-se mais frequente nos alimentos que estão à venda no supermercado. Também, por certo, conhecerá alguém retirou o glúten da sua alimentação e que opte por alimentos que não tenham determinados cereais na sua composição. Perante esta nova realidade, é importante perguntar: será que o glúten faz mal a saúde?

Antes de mais, é preciso perceber o que é o glúten: o glúten é um conjunto de proteínas de origem vegetal que está presente em alguns cereais – tais como trigo, cevada e centeio. É também utilizado em produtos de carne para aumentar o teor proteico. Como explica ao Viral Filipa Vicente, nutricionista e professora auxiliar do Instituto Egas Moniz, estas proteínas “são resistentes ao calor e conferem propriedades interessantes do ponto de vista de textura, sabor e humidade que são vantajosas em alguns alimentos específicos – como é o caso do pão”.

No entanto, algumas pessoas podem ser alérgicas a estas proteínas. Nesses casos, quando o indivíduo está em contacto com o glúten, o seu organismo desencadeia uma resposta imunitária intensa que pode manifestar-se em diversos órgãos e sistemas. Entre 1 e 3% da população portuguesa tem doença celíaca, uma doença autoimune que se caracteriza pela intolerância ao glúten.

“A grande maioria das pessoas – felizmente – não é alérgica ao glúten, que é o mesmo que dizer não têm uma doença celíaca”, esclarece ao Viral José Camolas, vice-presidente da Ordem dos Nutricionistas e professor na Faculdade de Medicina da Universidade de Lisboa e no Instituto Egas Moniz, ressalvando que a prevalência da doença tem registado um ligeiro aumento nos últimos anos.

“Ser sensível é uma coisa muito subjetiva e as sensibilidades não celíacas ao glúten são algo que não tem consenso na literatura, seja relativamente às prevalências, ao conjunto de sinais e sintomas, ao diagnóstico. Não existe nenhum tipo de concordância entre os especialistas”.

Por outro lado, existe um outro fenómeno associado ao glúten, mas que não reúne consenso por parte dos especialistas: as “sensibilidades ao glúten de natureza não celíaca”. “Ser sensível é uma coisa muito subjetiva e as sensibilidades não celíacas ao glúten são algo que não tem consenso na literatura, seja relativamente às prevalências, ao conjunto de sinais e sintomas, ao diagnóstico. Não existe nenhum tipo de concordância entre os especialistas”, prossegue o vice-presidente da Ordem dos Nutricionistas.

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Posto isto, será que o glúten é prejudicial à saúde? Não, não é. “É uma proteína como outra qualquer”, responde José Camolas. Para quem não tenha alergia ou sensibilidade ao glúten, estas proteínas não têm qualquer efeito adverso na saúde.

“Todos os alimentos, nutrientes e ingredientes alimentares autorizados são considerados seguros nas quantidades e utilização dentro da normalidade”, afirma Filipa Vicente. “O maior desafio no que diz respeito ao glúten é a sua omnipresença e, pode dizer-se, e a monotonia alimentar que leva um indivíduo a ingerir diariamente um conjunto de alimentos com a mesma base de trigo – pão, cereais de pequeno-almoço, bolachas, tostas.”

“O maior desafio no que diz respeito ao glúten é a sua omnipresença e, pode dizer-se, e a monotonia alimentar que leva um indivíduo a ingerir diariamente um conjunto de alimentos com a mesma base de trigo – pão, cereais de pequeno-almoço, bolachas, tostas.”

Também José Camolas coloca na equação a proporção de glúten que atualmente integra a alimentação diária. “A quantidade excessiva de glúten na alimentação pode manifestar-se com sinais de intolerância. Não é uma alergia àquela proteína, é sobretudo uma intolerância a quantidades excessivas daquela proteína”, esclarece.

Filipa Vicente identifica que, “numa alimentação dita comum com o padrão chamado ocidental ingere-se entre cinco e 20 gramas de glúten por dia”. E cita um estudo realizado na Dinamarca, onde foi concluído que a ingestão média diária de glúten no país é de 10 gramas. “Considerando uma ingestão diária recomendada de 0,8 gramas de proteína por quilograma de peso para um indivíduo de 70 quilos, estamos a falar de 18% da proteína ingerida diariamente”, alerta a nutricionista.

A juntar a isso, regista-se também uma “baixa ingestão de leguminosas e de outros cerais nutricionalmente ricos como fontes de hidratos de carbono”. “O problema não está no glúten, mas sim no que não é ingerido e na monotonia das fontes de hidratos de carbono”, conclui.

Para José Camolas há ainda outra questão: o processamento dos alimentos que contêm glúten. O nutricionista sublinha que, nos últimos anos, as farinhas “têm processos de dito melhoramento” que lhe atribuem “características para que o processo de panificação seja mais rápido”. Considera que “este processo de fermentação acelerado e, às vezes, incompleto, pode associar-se a estas manifestações de intolerância ou de sensibilidade”.

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“Podemos estar a chamar intolerância ao glúten, quando, se calhar, devíamos estar a chamar intolerância a produtos ricos em glúten. Sendo que uma parte desta intolerância pode ser imputável à quantidade excessiva de glúten, mas outra parte pode ser imputada a outros componentes do produto e até ao seu processamento.”

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Concluindo: o glúten é uma proteína de origem natural e só é prejudicial para as pessoas que têm doença celíaca (alergia ao glúten) ou que apresentem sensibilidades de natureza não celíaca. Para quem não tem qualquer uma destas condições, a ingestão de glúten não representa qualquer malefício para a saúde. No entanto, é importante ter em atenção as quantidades ingeridas, uma vez que o excesso de glúten pode desencadear reações ou sensibilidades à proteína. Por isso, é aconselhado fazer uma alimentação variada e evitar a monotonia das fontes de hidratos de carbono.

7 Abr 2022 - 11:22

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