Todas as pessoas com endometriose são inférteis?
“Tenho endometriose, vou conseguir engravidar?”. Esta é a questão que muitas mulheres fazem após o diagnóstico de endometriose, uma doença que atinge cerca de uma em cada 10 mulheres em idade fértil. O Viral procurou esclarecer a questão junto do ginecologista e obstetra Miguel Raimundo, especialista em medicina reprodutiva.
Mulheres com endometriose podem conseguir engravidar?
“Nem todas, mas é possível”, afirma o obstetra Miguel Raimundo, quando questionado sobre se as mulheres com endometriose também podem conseguir engravidar.
O especialista começa por explicar que, “com conforto e qualidade de vida adequada”, há mulheres que conseguem engravidar “de forma natural, sem tratamentos”.
As mulheres devem procurar ajuda de um especialista para possíveis tratamentos, “após seis meses a tentar sem sucesso”, refere Miguel Raimundo, acrescentando que até mesmo pessoas com endometriose profunda podem conseguir engravidar, apesar de as “probabilidades diminuírem”.
No entanto, ressalva: “As mulheres com endometriose devem tentar engravidar o mais cedo possível porque, à medida que a idade aumenta, a qualidade dos óvulos é menor e, consequentemente, a probabilidade de engravidar diminui”.
Depois de engravidarem, é frequente as mulheres referirem “uma melhoria dos sintomas da endometriose”, completa.
Mas há riscos, acrescenta o especialista, nomeadamente uma maior probabilidade de descolamento da placenta, partos pré-termo e pré-eclâmpsia.
Apesar de uma gravidez não ser considerada “de risco” pelo facto de a mulher ter endometriose, “convém ter algum tipo de atenção, sobretudo com histórico de cirurgias anteriores”.
Em suma, a ideia de que todas as pessoas com endometriose são inférteis é falsa.
Mas o que é a endometriose?
A endometriose é uma doença crónica que pode “afetar muito a qualidade de vida das mulheres”. Provoca dores menstruais, nas relações sexuais, a urinar, a evacuar e ainda dores pélvicas. Mas “nem todas as mulheres com a doença têm estas cinco manifestações”, esclarece o especialista ouvido pelo Viral.
Na prática, a endometriose consiste na presença do endométrio (o tecido de revestimento do útero) fora do útero, que sofre transformações semelhantes às que acontecem durante o ciclo menstrual e se traduzem em dor.
Como afeta a fertilidade?
Os números em relação à infertilidade nas mulheres com endometriose variam. No entanto, a Endometriosis Foundation of America apontava, em 2010, para entre 35 a 50%, um número também referido num artigo da Clinical Obstetrics and Gynecology.
Há, sobretudo, três fatores apontados por Miguel Raimundo que afetam a fertilidade: a “qualidade dos óvulos e embriões, as trompas obstruídas e a recetividade endometrial”.
Na prática, por vezes, “os óvulos são de má qualidade, não são fecundados, são muito fragmentados e o número de embriões é menor”, esclarece.
Por outro lado, ter as trompas de Falópio obstruídas significa que as “células de endometriose se implantaram nas trompas, provocaram fibrose e as trompas ficaram fechadas”.
Em relação ao diagnóstico, cujo tempo “varia muito” com a sensibilidade dos médicos para a doença, pode ser feito de várias formas: observação de lesões, ecografia, ressonância e biópsia a lesões sugestivas.
Que tratamentos podem fazer, se não conseguirem engravidar?
Em primeiro lugar, tem de ser feita uma avaliação global, “estudar o homem e a mulher”. Na mulher, é preciso “avaliar a reserva ovárica e estudar as trompas de Falópio”, e o homem deve realizar um espermograma, esclarece o especialista em medicina reprodutiva.
“Se estiver tudo normal, podemos tentar fazer tratamentos de primeira linha, como o coito programado e a inseminação artificial. Se tiver as trompas obstruídas, falamos em tratamentos de segunda linha: a fertilização in vitro”, acrescenta.
Estes tratamentos são também referidos num estudo da Abdominal Radiology, em que se descreve o impacto da doença na fertilidade como algo complexo.
O médico consultado pelo Viral reafirma que, “quanto mais cedo as mulheres com endometriose começarem a tentar engravidar, melhor”.
No entanto, caso a mulher queira engravidar mais tarde, pode fazer sentido congelar óvulos “para garantir a qualidade dos mesmos”. É recomendado que o façam antes dos 35 anos, acrescenta Miguel Raimundo. Esta idade é também apontada num estudo da American Society for Reproductive Medicine, publicado em 2019, para o qual foram observadas 485 mulheres com endometriose durante 11 anos.
Além destes tratamentos, Miguel Raimundo refere outros “que já têm mostrado alguma evidência e da qual se fala cada vez mais” – como, por exemplo, fisioterapia do pavimento pélvico – e destaca o acompanhamento de um nutricionista como uma medida que pode ajudar a lidar com a doença.
Quais os sinais que merecem atenção?
Questionado sobre os sintomas a que as mulheres devem estar atentas, Miguel Raimundo salienta que “as dores menstruais, dores com impacto na nossa qualidade de vida, não são normais”.
Acresce a preocupação, se estas dores estiverem associadas a outras, tais como dores “nas relações sexuais, a urinar, a evacuar ou pélvicas”, alerta o mesmo médico.
Uma em cada 10 mulheres em idade fértil tem endometriose. Em todo o mundo, estima-se que a doença atinja 176 milhões de mulheres.
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