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Chá de alecrim protege o cérebro da doença de Alzheimer?

9 Mar 2023 - 09:16
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Chá de alecrim protege o cérebro da doença de Alzheimer?

Da salsa às folhas de louro, as plantas aromáticas são, muitas vezes, protagonistas de receitas caseiras supostamente milagrosas partilhadas online. Em várias publicações das redes sociais alega-se, por exemplo, que o chá de alecrim protege o cérebro da doença de Alzheimer.

Os autores destas publicações defendem que o alecrim tem o poder de “melhorar a memória” e que, por isso, o chá feito a partir desta erva terá a capacidade de proteger o cérebro de alguns tipos de demência. Mas há evidência científica suficiente para suportar esta teoria? Em declarações ao Viral, o neurologista e vice-presidente da Sociedade Portuguesa Neurologia (SPN), Rui Araújo, esclarece todas as dúvidas.

É verdade que o chá de alecrim protege o cérebro da doença de Alzheimer?

chá de alecrim

De facto, há alguma evidência preliminar (aqui, aqui e aqui) a sugerir que alguns componentes do alecrim – como o ácido rosmatínico – poderão ter benefícios para o cérebro. No entanto, os estudos disponíveis não são suficientes para afirmar que o chá de alecrim protege o cérebro da doença de Alzheimer.

Em primeiro lugar, boa parte destes estudos foram realizados em células ou em animais. Assim sendo, não é correto fazer uma extrapolação e afirmar que os resultados em humanos seriam iguais.

Num dos trabalhos, publicado em 2022, os investigadores admitem que o seu estudo tem algumas limitações, sublinhando que “os modelos animais com défice cognitivo não representam plenamente aspetos da função cognitiva humana, limitando assim a transposição dos resultados para o ser humano”.

Por outro lado, os estudos existentes sobre o impacto dos compostos desta erva na doença de Alzheimer não testaram os efeitos do consumo do chá de alecrim, mas sim de extratos da planta. Logo, não é possível confirmar que o consumo do chá de alecrim tenha os mesmos benefícios para os quais os estudos apontam.

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Além disso, apesar de os investigadores responsáveis por estes estudos considerarem os seus resultados “promissores”, admitem a necessidade de mais estudos.

“Mais investigação neste campo irá, portanto, fornecer mais provas sobre o potencial terapêutico dos compostos do alecrim. Todos os dados disponíveis até à data sugerem, contudo, que o seu efeito sobre a doença de Alzheimer é muito promissor e que se justifica a continuação da investigação, incluindo ensaios clínicos”, lê-se na conclusão de um estudo de 2016.

No mesmo plano, adianta Rui Araújo, não existe “evidência formal, bem estabelecida” de que “o alecrim ou qualquer outro tipo de suplemento alimentar tenha algum tipo de interferência real e sustentada em doenças degenerativas, como o Alzheimer ou o Parkinson”, por exemplo.

O neurologista admite existir “uma grande procura por soluções alternativas através de alimentos e suplementos alimentares” para várias doenças. Aliás, “existem sempre publicações neste sentido de potencial terapêutico” que surgem, muitas vezes, “como se fossem uma solução para várias doenças”, refere.

O que acontece nestes casos, na visão do especialista, é que se tiram conclusões precipitadas baseadas em estudos preliminares. “Tendo em conta o tópico que é”, quando as conclusões são positivas, a informação “dissemina-se pela internet e pela comunidade”, mesmo quando não há consenso sobre determinado tema.

Contudo, não há provas da eficácia do chá de alecrim (ou de qualquer outra planta) na “melhoria da memória” ou na proteção do cérebro “contra o Alzheimer”.

O que é a doença de Alzheimer e qual o tratamento comprovado?

chá de alecrim

Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), a doença de Alzheimer é o tipo de demência mais comum. Os dados mais recentes indicam que “mais de 55 milhões de pessoas (8,1% de mulheres e 5,4% de homens com mais de 65 anos) vivem com demência”, sendo que 60% a 70% destas têm doença de Alzheimer.

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É uma doença “que leva à deterioração da função cognitiva, ou seja, da capacidade de processar o pensamento”, explica-se no mesmo artigo.

“Afeta a memória, o pensamento, a orientação, a compreensão, o cálculo, a capacidade de aprendizagem, a linguagem, e o julgamento”, lê-se.

Além da função cognitiva ser comprometida, esta é, de modo geral, acompanhada por “mudanças no humor, no controlo emocional, no comportamento, ou na motivação”.

A OMS alerta para o facto de não existir, atualmente, nenhum tratamento para curar qualquer tipo de demência. “Os tratamentos existentes são para atenuar os sintomas da doença e não para travar ou para reduzir a progressão”, acrescenta Rui Araújo.

Nesse sentido, existe medicação que pode ajudar a tratar os sintomas típicos da patologia, como “os esquecimentos, as desorientações e as alterações de comportamentos”, esclarece o vice-presidente da SPN. 

“Mais recentemente”, continua, “foram aprovados, nos Estados Unidos, medicamentos considerados inovadores”. No entanto, ainda não há a aprovação desses fármacos na Europa, devido “a alguma controvérsia e algum desentendimento entre a própria comunidade científica”.

Não havendo ainda a possibilidade de cura, a OMS realça algumas formas de apoiar e melhorar a vida das pessoas com demência e dos seus familiares e cuidadores, tais como: o “diagnóstico precoce”; a “otimização da saúde física, cognição, atividade e bem-estar”; a “identificação e tratamento de doenças físicas de acompanhamento”; a “compreensão e gestão das mudanças de comportamento”; e o fornecimento de “informação e apoio a longo prazo aos prestadores de cuidados”.

Em suma, não há evidência científica robusta para comprovar a eficácia do chá de alecrim na proteção do cérebro contra a doença de Alzheimer. A demência não tem cura, mas existe medicação aprovada pela comunidade médica, com efeito na atenuação dos sintomas da patologia.

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Categorias:

Neurologia

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Alzheimer | Neurologia

9 Mar 2023 - 09:16

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