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Aplicar sal ajuda a tratar as aftas? E é seguro?

5 Dez 2024 - 09:10

Aplicar sal ajuda a tratar as aftas? E é seguro?

Em vídeos partilhados no TikTok, alega-se que aplicar sal diretamente nas aftas ajuda a curá-las de forma mais rápida. Segundo estes posts, além de o sal ter “propriedades antimicrobianas”, esta técnica vai “desidratar a área e reduzir o inchaço”. Mas será mesmo assim? Colocar sal diretamente nas aftas ajuda a tratá-las?

É verdade que aplicar sal ajuda a tratar as aftas?

Em declarações ao Viral, Tiago Fonseca, médico estomatologista na Unidade Local de Saúde (ULS) de São João, começa por adiantar que “não existe evidência científica” de que colocar sal diretamente nas aftas ajuda a tratá-las.

O estomatologista começa por explicar que uma afta “é uma úlcera”, ou seja, “é um tipo específico de ferida que só ocorre nas mucosas” (ver também aqui).

Por norma, as aftas são “pequenas, de forma arredondada, costumam ter um fundo amarelado e uma circunferência avermelhada e podem ser precedidas por uma pequena bolha (vesícula)”, prossegue.

As aftas correspondem sempre “a um processo inflamatório”, ou seja, “há qualquer coisa que ‘desregula’ o nosso sistema imunitário” provocando, “pontualmente, em alguns locais, essa manifestação”, esclarece Tiago Fonseca. 

De modo geral, essa inflamação pode surgir devido a: “hipersensibilidade a certos alimentos (ácidos, salgados ou condimentados, por exemplo)”; “stress e ansiedade”; “imunocompromisso por doenças, medicamentos, ou outras terapêuticas”; “défices vitamínicos ou outras carências nutritivas”; ou “alterações hormonais” (sobretudo nas mulheres).

Normalmente, as aftas acabam por “desaparecer por si próprias, ao fim de uma ou duas semanas”, refere-se num texto informativo publicado no site do Serviço Nacional de Saúde britânico (NHS, na sigla inglesa).

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Isto porque, explica Tiago Fonseca, “o processo inflamatório que causa a afta também induz a cicatrização”, ou seja, tal como qualquer ferida, a afta “passa por um processo de cicatrização que é a resposta normal do organismo a uma determinada lesão”.

Colocar sal diretamente nas aftas não vai acelerar o processo de cura e até pode ter o efeito contrário ao pretendido.

Aliás, em termos práticos, “não se consegue fazer” isto de forma eficaz, uma vez que o sal vai “dissolver-se com a saliva e espalhar-se pela boca”, esclarece Tiago Fonseca.

Em teoria, mesmo que fosse possível manter o sal no local pretendido, iria haver sempre “uma ‘chamada’ da água que está entre as células, nos tecidos”, para o sítio da afta, de forma a “haver a dissolução do sal”.

Esta ação “vai agravar a dor” de forma imediata e “até pode chegar ao ponto de matar as células, não só as localizadas na afta, mas também as células do sistema imunitário que estão a promover a cicatrização”, salienta o estomatologista.

De forma simples, “e pouco científica, é como se o sal ‘queimasse’ a afta”, clarifica.

De facto, o sal tem propriedades antimicrobianas, como se alega nas publicações. Isto é, “pode ‘matar’ bactérias que estejam presentes na afta e, eventualmente, ajudar a combater uma eventual infeção associada”.

Mas ao aplicar-se o sal está a supor-se, de forma errada, “que existe uma infeção”, defende Tiago Fonseca. No entanto, importa salientar que “a boca tem centenas de tipos de bactérias diferentes”, que fazem parte de “uma flora microbiana oral comensal”.

Existe “um convívio habitualmente saudável entre esses microorganismos e o hospedeiro: nós”. Mas “termos essa flora microbiana oral normal não significa que existam infeções na boca”, sustenta.

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Assim sendo, colocar sal diretamente nas aftas para acelerar a cura é uma técnica “despropositada”, “sem sustentação científica” e que “só vai provocar mais dor”, conclui (ver também aqui).

Existe alguma forma de acelerar o processo da cura das aftas?

Segundo Tiago Fonseca, “a melhor forma de acelerar o processo de cura das aftas é dar as melhores condições ao organismo para ele cicatrizar”.

Isso pode ser feito através de medidas de conforto que ajudam com os sintomas. Uma das principais medidas a tomar é evitar “agentes causadores”, “desencadeantes” e “agravantes”.

Por exemplo, “se foi um alimento ácido que causou a afta”, deve-se evitá-lo nesta fase, bem como se deve restringir outros alimentos ácidos.

Se a pessoa tem conhecimento de agentes desencadeantes também deve evitá-los. Tiago Fonseca dá outro exemplo: “Se o stress desencadeia o aparecimento de aftas” a uma determinada pessoa, deve ser gerido da melhor forma possível.

Caso o doente já tenha aftas na boca, é importante que evite “agentes agravantes”, como o tabaco, “o álcool” e “alimentos quentes ou duros”. Tudo isso “vai agravar o desconforto ou a dor”, clarifica.

Além disso, a pessoa também pode “recorrer a medicação” (ver aqui). É possível “aplicar um anestésico tópico, fazer um analgésico ou um anti-inflamatório (como o paracetamol ou ibuprofeno)”, acrescenta.

Uma medida “analgésica natural” que pode funcionar no alívio dos sintomas é “aplicar frio no local” da afta. Tal como o estomatologista já tinha explicado, em declarações anteriores ao Viral, não é aconselhável aplicar gelo diretamente na úlcera.

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Contudo, como “um processo inflamatório está sempre associado a calor”, “beber água fria, ou manter água fresca na boca antes de engolir ou deitar fora” pode “ajudar a diminuir esse processo inflamatório”, refere.

Tiago Fonseca lembra ainda que “não há propriamente medicamentos ou produtos regenerativos”. Existem, sim, substâncias que dão ao organismo as melhores condições para que ele faça a cicatrização.

5 Dez 2024 - 09:10

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