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Sentar em sanitas públicas. Há risco de “apanhar doenças”?

O receio de "apanhar doenças" ou infeções sexualmente transmissíveis leva algumas pessoas a evitar sentar-se em sanitas públicas. Mas será que esse risco é real?

27 Out 2022 - 10:37

Sentar em sanitas públicas. Há risco de “apanhar doenças”?

O receio de "apanhar doenças" ou infeções sexualmente transmissíveis leva algumas pessoas a evitar sentar-se em sanitas públicas. Mas será que esse risco é real?

Ir a uma casa de banho pública é, para algumas pessoas, o mesmo que fazer um agachamento em equilíbrio, sempre com o cuidado de não tocar em nada. Às crianças, alguns pais ensinam que não se devem sentar nas sanitas públicas, porque, com esse gesto, podem “apanhar doenças” e desenvolver infeções. Verdade ou mito?

É possível “apanhar doenças” ao sentar-se em sanitas públicas?

O risco de “apanhar doenças” do trato urinário ao utilizar uma sanita pública é “muito diminuto”, explica ao Viral Tiago Antunes Lopes, urologista no Centro Hospitalar de São João e professor auxiliar na Faculdade de Medicina da Universidade do Porto (FMUP). Até porque as infeções urinárias – muitas vezes usadas como argumento para não se sentar na sanita pública – não são transmissíveis de pessoa para pessoa.

“As infeções urinárias resultam de um aumento bacterial do trato intestinal que coloniza a urina, a uretra e a bexiga. Uma bactéria patogénica que aumente a população e crie desequilíbrio na microbiota, causa uma infeção urinária”, adianta o urologista. 

Estas infeções podem provocar vários sintomas: inflamação da bexiga, sangue na urina, dores suprarrenais, sintomas de armazenamento e ardor a urinar. 

Quando alguém se senta na sanita não vai colocar os órgãos genitais e urinários em contacto com a superfície, a única coisa que fica em contacto com a sanita é a pele das coxas. Por essa razão, é altamente improvável que exista uma contaminação dos órgãos do trato urinário ou sexual.

“A pele é uma barreira”, lembra o urologista. Por isso, “se tivermos problemas na barreira, o contacto com microrganismos pode desenvolver problemas de pele”. No entanto, ressalva, “isso não é exclusivo das casas de banho públicas. Isso acontece também no contacto com superfícies onde muita gente convive, que podem conter germes associados a infeções”. 

As infeções urinárias ocorrem mais frequentemente nas mulheres devido à dimensão inferior da uretra, quando comparada com os homens. Por essa razão, os microrganismos têm mais facilidade em chegar à bexiga e propagar-se, provocando a infeção. No entanto, o urologista alerta que uma má micção urinária nas mulheres é muito mais perigosa do que sentar-se na sanita.

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“A maior parte das mulheres urina por relaxamento. Se está com o pavimento pélvico contraído para se manter nessa posição [de agachamento, sem se sentar] a probabilidade de ter uma micção fluída e de conseguir esvaziar totalmente a bexiga é menor. Isso não é bom. Se for uma situação repetida, pode dar origem a uma disfunção miccional, ou seja, pode nunca conseguir relaxar para urinar”, alerta Antunes Lopes.

Ao não esvaziar por completo a bexiga, a mulher poderá estar a potenciar o risco de desenvolver infeções urinárias, uma vez que as bactérias não são expelidas completamente, aumentando a concentração existente no sistema urinário.

“A mulher desenvolver uma má tipologia de micção por não conseguir relaxar e não conseguir esvaziar a bexiga, é muito mais perigoso para desenvolver infeções urinárias do que sentar-se, urinar e ir embora”, reforça o urologista. 

É possível contrair uma infeção sexualmente transmissível ao sentar em sanitas públicas?

Também o medo de apanhar uma doença sexualmente transmissível ou uma infeção genital ao sentar-se em sanitas públicas não é justificado. “Impossível não será, mas é altamente improvável”, afirma Alexandra Matias, assistente graduada no departamento de Ginecologia e Obstetrícia do Hospital de São João e professora catedrática na FMUP.

Para que existisse “um risco remoto de infeção” teria de “haver uma ferida na zona genital” que estivesse em contacto direto com a superfície da sanita – onde potencialmente estariam os microrganismos patogénicos – e permitisse a entrada das bactérias, fungos ou vírus. Ora, numa utilização correta da sanita, os órgãos genitais não estão em contacto com a superfície.

“Numa doença sexualmente transmissível como a gonorreia ou a clamídia, os microrganismos teriam de entrar [no órgão genital] para colonizar a vagina, a uretra ou o pénis. É quase um mito: não é impossível contrair estas doenças [utilizando sanitas públicas], mas é altamente improvável”, afirma a ginecologista.

Com o aparecimento da covid-19, os investigadores analisaram os riscos de transmissão de várias doenças infeciosas nos lavabos públicos. Uma revisão sistemática, publicada na revista Science of The Total Environment em 2022, conclui que, apesar de as “superfícies das casas de banho públicas poderem estar contaminadas com bactérias e vírus particularmente quando são muito usadas e não são limpas frequentemente”, o risco de desenvolver “novas infeções é baixo em indivíduos saudáveis”.

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Utilizar papel higiénico como barreira e o (real) risco de puxar o autoclismo

Para contornar o medo de sentar nas sanitas públicas, há quem utilize a técnica de cobrir o tampo com papel higiénico. Mas esta prática atua, sobretudo, a nível psicológico, diminuindo a repulsa de estar em contacto com uma superfície usada anteriormente por outras pessoas.

Tiago Antunes Lopes afirma que o papel higiénico “pode servir de barreira para não se sujar com urina”. No entanto, é usado mais por uma “questão mental”, ou seja, para ultrapassar a “repugnância” associada ao uso de sanitas públicas. Também Alexandra Matias lembra que “o papel higiénico é muito poroso, não é impermeável”. Por isso, “mais vale passar uma toalhita higienizante, que tem uma solução antissética”, aconselha a ginecologista.

Se o uso das sanitas públicas tem risco de infeção ou de doença muito diminuto, é no final da utilização que deverá estar a atenção. Ao puxar o autoclismo, poderá estar a espalhar aerossóis com microrganismos de potencial patogénico. 

“O real risco não é sentar-se, é quando puxa a descarga de autoclismo. Há a possibilidade de aerossóis serem pulverizados até três metros e ficam ali entre 35 e 70 segundos após a descarga”, alerta a ginecologista, citando as conclusões de uma revisão sistemática. Para evitar que tal propagação ocorra, deverá fechar a tampa antes de premir o autoclismo. 

A má ventilação dos lavabos públicos potencia o aumento de microrganismos no espaço. Um estudo publicado pela Scientific Reports, em 2021, identificou bactérias aerossolizadas nas superfícies próximas das sanitas públicas. 

“Se os materiais de construção e os caixotes do lixo sem tampa não forem efetivamente resistentes às bactérias, ou se não houver equipamento de esterilização ou ventilação suficiente nas casas de banho públicos, a carga bacteriana nas casas de banho excederá a do exterior por fatores entre 1,5 e 5 vezes”, concluem.

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Uma boa higienização das mãos é muito importante para proteger a  saúde, seja quando se usa a casa de banho ou quando se toca em superfícies usadas por muita gente. As mexer com as mãos no nariz, boca ou olhos, poderá estar a facilitar-se a entrada dos microrganismos no corpo, o que pode resultar no aparecimento de infeções. Por isso, lavar as mãos com sabonete, durante 20 segundos, e depois secá-las com toalhitas de papel ou de pano reduz o risco de contaminação com bactérias, fungos e vírus.

27 Out 2022 - 10:37

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