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Do cérebro ao comportamento: Especialista alerta para perigos do álcool na adolescência

7 Set 2024 - 08:30

Do cérebro ao comportamento: Especialista alerta para perigos do álcool na adolescência

O tema do consumo de álcool na adolescência ganhou destaque nos jornais, esta semana, quando a Autoridade de Segurança Alimentar e Económica (ASAE) divulgou ter identificado 17 jovens menores (dos quais seis tinham menos de 16 anos) “em pleno ato de consumo de bebidas alcoólicas” no Festival do Crato. 

Apesar de ser uma prática comum os jovens portugueses – incluindo os menores de idade – consumirem bebidas alcoólicas com alguma regularidade, os riscos associados a esse hábito preocupam os especialistas.

Em esclarecimentos ao Viral, Joana Teixeira, presidente da Sociedade Portuguesa de Alcoologia (SPA) e Coordenadora da Unidade de Alcoologia e Novas Dependências do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa, explica porque é que o consumo de bebidas alcoólicas por menores tem riscos acrescidos para a saúde.

Porque é que os adolescentes correm riscos acrescidos quando consomem álcool?

Joana Teixeira começa por explicar que, tal como a Organização Mundial de Saúde indica, não existe um nível de consumo de álcool seguro, seja qual for a idade da pessoa. Mas, para os adolescentes, o consumo de bebidas alcoólicas apresenta ainda mais riscos. Eis as razões:

Em primeiro lugar, avança a médica, é importante ter em conta que, “em termos cerebrais, o desenvolvimento dos neurónios e das conexões neuronais ainda não está completamente terminado antes da idade adulta, ou seja, antes dos 18 anos”.

Nesse sentido, o consumo de álcool em idade precoce “vai interferir negativamente no estabelecimento dessas conexões cerebrais”. 

Assim sendo, quanto mais precoce for esse consumo, “maior o dano cerebral, porque o cérebro está menos desenvolvido”. Por outras palavras, um jovem de 13 anos que consuma bebidas alcoólicas corre um risco maior, do ponto de vista cerebral, do que um jovem de 17.

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Este risco traduz-se, por exemplo, em “danos no desenvolvimento e estruturação das habilidades cognitivo-comportamentais e emocionais, causando modificações neuroquímicas, com prejuízos na memória, aprendizagem e controlo dos impulsos”, refere-se num texto informativo da ASAE.

A “exposição aos riscos” também é um fator “particularmente sensível” quando se fala em consumo de álcool por menores, apesar de este aspeto não ser exclusivo dos jovens.

Ao consumir álcool, “a pessoa fica mais desinibida e a probabilidade de ter comportamentos de risco (a nível sexual ou acidental, por exemplo) aumenta”, refere Joana Teixeira. 

Por norma, quando consomem bebidas alcoólicas, os adolescentes estão “em ambientes propícios a situações de risco, sem controlo parental”, esclarece.

Noutro plano, para “quem tem uma tendência genética para desenvolver uma perturbação do uso do álcool – seja uma dependência ligeira ou mais grave – quanto mais precoce for o consumo, maior é o risco” de problemas futuros  relacionados com o consumo de álcool.

A estes riscos acrescem as consequências válidas para as restantes faixas etárias. Joana Teixeira lembra que “o álcool é um fator de risco evitável que contribui para o desenvolvimento de mais de 200 doenças” (ver aqui).

Entre elas estão: o cancro (“da orofaringe, do fígado, do cólon, do pâncreas, da mama”, entre outros); as perturbações do espetro alcoólico fetal (se houver consumo durante a gravidez); “doença hepática crónica”; “diabetes”; “insuficiência pancreática”; e a “doença cardiovascular”, exemplifica.

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Consumo de álcool nos jovens: “Um problema atual enorme”

Conforme os dados mais recentes da Organização Mundial de Saúde (OMS), “o álcool é, de longe, a substância mais utilizada pelos adolescentes”.

Segundo um texto informativo da OMS, “mais de metade (57%) dos jovens de 15 anos já experimentou álcool pelo menos uma vez (56% dos rapazes e 59% das raparigas) e quase 40% referiram ter consumido álcool nos últimos 30 dias (36% dos rapazes e 38% das raparigas)”.

Além disso, acrescenta-se, “cerca de 1 em cada 10 adolescentes de todas as faixas etárias já experimentou embriaguez significativa”, ou seja, já passou por uma embriaguez “pelo menos duas vezes durante a vida”.

Joana Teixeira considera importante realçar ainda que “a diferença entre sexos está menor”, isto é, “o consumo das mulheres está mais próximo do consumo dos homens”.

Isto verifica-se tanto nos adultos como nos adolescentes. Segundo um texto informativo do Instituto Nacional sobre o Abuso do Álcool e o Alcoolismo dos Estados Unidos (NIAAA, na sigla inglesa), “historicamente, os rapazes adolescentes eram mais propensos a beber e a beber em excesso do que as raparigas”, mas “atualmente, essa relação inverteu-se”. 

Para Joana Teixeira, este é “um problema atual enorme”, pelos riscos que o consumo de álcool precoce acarreta para os jovens.

No texto da OMS defende-se que “estes resultados realçam a disponibilidade e a normalização do álcool, mostrando a necessidade urgente de melhores medidas políticas para proteger as crianças e os jovens dos danos causados pelo álcool”.

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Na perspetiva de Joana Teixeira, estas medidas devem passar, em primeiro lugar, “pela psicoeducação nas escolas”.

A especialista acredita que “os jovens devem ser sensibilizados, desde cedo, para as consequências do consumo do álcool, não numa perspetiva proibitiva, mas numa perspetiva informativa”.

Por exemplo, “se perguntarmos a qualquer jovem” sobre o tabaco “é mais frequente eles saberem identificar a neoplasia do pulmão, a falta de ar e todos os riscos associados ao consumo de tabaco do que se perguntarmos sobre o álcool”, expõe.

7 Set 2024 - 08:30

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