Maquilhagem com fator de proteção solar substitui o protetor? Especialistas respondem
O protetor solar deve ser usado todos os dias, durante todo o ano, em qualquer circunstância. Até mesmo em casa. Mas, no verão, quando passamos mais tempo ao sol, torna-se indispensável redobrar os cuidados.
Nesse sentido, vários produtos de maquilhagem, como bases, blushs, primers e pós, que já contêm algum fator de proteção solar (FPS). Mas será esta proteção suficiente? E este tipo de maquilhagem dispensa o uso de protetor?
Usar maquilhagem com proteção solar dispensa o uso de protetor?
Em declarações ao Viral, Marta Ferreira, farmacêutica, pós-graduada em Cosmetologia Avançada, doutoranda em Ciências Farmacêuticas e autora do “Livro da Pele” e do blogue “A Pele Que Habito”, adianta que o uso de maquilhagem com fator de proteção solar “em princípio não será suficiente” para prescindir do uso de protetor solar, visto que o “uso real” de uma base com proteção solar e de um protetor é “totalmente diferente”.
Em primeiro lugar, a farmacêutica esclarece que, na “teoria”, um protetor solar ou um produto de maquilhagem com FPS 50 (fator de proteção solar 50) são “ a mesma coisa”, ou seja, têm a mesma proteção. No entanto, não é bem assim, visto que as pessoas não aplicam a mesma quantidade de base que aplicariam de protetor solar.
“É aqui que está o problema. Cada pessoa utiliza a quantidade de base que acha adequada para si. Pode escolher aplicar mais para ter cobertura mais elevada ou aplicar menos para uma cobertura mais leve”, afirma Marta Ferreira.
Assim sendo, os produtos de maquilhagem com proteção solar “estão muito mais sujeitos” a variações de quantidade aplicada do que o protetor. No caso do protetor solar, as pessoas estão mais habituadas a aplicar a “quantidade certa ou até superior”.
Na mesma linha, Luís Uva, dermatologista e diretor clínico da Personal Derma, diz que, mesmo que um determinado produto de maquilhagem com proteção solar tenha uma proteção alta (FPS 30 ou 50), seria necessário aplicar uma “quantidade generosa” do mesmo para dispensar o uso do protetor solar.
“Se não aplicarmos a quantidade adequada de maquilhagem, não vai ser suficiente”, afirma o médico dermatologista, acrescentando que, nesses casos, é preferível usar um protetor solar antes de aplicar o produto de maquilhagem para se obter uma “proteção totalmente eficaz”.
Noutro plano, Marta Ferreira defende que as pessoas têm uma visão “muito mais vincada” sobre a quantidade de protetor solar a aplicar para conseguir uma proteção adequada, ao contrário do que acontece com a maquilhagem, que aplicam na quantidade que lhes parece mais adequada.
“É improvável que alguém vá usar a quantidade de maquilhagem com proteção solar que seria necessária para alcançar o FPS rotulado na maquilhagem”, remata a autora do blog “A Pele Que Habito”.
A Cosmetics Europe – The Personal Care Association, associação europeia na área da indústria de cosméticos e cuidados pessoais, reconhece que a maquilhagem com FPS “ajuda a filtrar os raios UVB”, mas considera que “não substitui” o protetor solar.
Também Vera Leitão, dermatologista no Hospital de Loulé, nas clínicas Vivina Cabrita e Rizo & Mendonça e professora na Faculdade de Medicina e Ciências Biomédicas da Universidade do Algarve, defende que “é difícil admitir uma eficácia a 100% de maquilhagem com proteção solar”.
A professora universitária explica que a eficácia “depende do uso que cada pessoa lhe dá”, por exemplo, se a quantidade é suficiente e se está bem espalhada.
“O aconselhado seria que aplicassem várias vezes ao dia, mas isso não acontece”, refere.
Para o Cancer Research UK, a maquilhagem com FPS “não é” suficiente. No site do centro de investigação lê-se que as pessoas precisariam de “aplicar várias vezes” a base com proteção solar para atingir o nível de proteção indicado no produto.
Também a Agência Australiana de Proteção Radiológica e Segurança Nuclear (ARPANSA) admite que a maquilhagem e os protetores labiais com FPS dão “alguma proteção” contra a radiação, mas considera que esses produtos têm uma “função diferente do protetor solar”.
Em declarações ao Viral, a dermatologista Vera Leitão reconhece que é melhor os produtos terem proteção solar do que não terem, mas prefere recomendar o uso de “protetor solar com cor, sem perfume e com poucos princípios ativos”, em vez de maquilhagem com proteção solar porque a maquilhagem é “mais difícil” de aplicar de forma correta e em quantidades certas.
Protetor solar e maquilhagem com proteção “não se anulam”
Ao Viral, o dermatologista Luís Uva refere que o protetor solar e a maquilhagem “não se anulam”. Isto é, nada impede de aplicar o protetor e, por cima, os produtos de maquilhagem com FPS.
O diretor clínico da Personal Derma explica que, “quanto mais camadas, melhor”. Ou seja, a pele fica “mais protegida contra os raios solares quanto mais camadas de proteção tiver”.
A mesma ideia é defendida num estudo publicado em 2021 que sugere que a proteção solar vai ser maior com várias camadas de protetor solar e de maquilhagem.
Na investigação, os autores analisaram o uso real dos produtos e verificaram que, após a aplicação, a proteção foi “drasticamente menor” à indicada no rótulo.
Contudo, a aplicação de várias camadas aumentou muito o SPF em comparação com o obtido numa única aplicação. Nesse sentido, os autores sugerem que aplicar várias camadas de proteção solar com maquilhagem compensa a aplicação insuficiente de uma só camada.
Noutra investigação, publicada em 2019 no British Journal of Dermatology, em que foi avaliada a aplicação de seis diferentes tipos de protetor solar, os resultados mostram um “nível abaixo do ideal” em todos, ou seja, nenhum dos produtos revelou o nível de proteção indicado no rótulo. Neste sentido, os autores destacam que a “falsa sensação” de proteção solar é um “problema”.
A importância da proteção solar
Luís Uva destaca que a proteção solar é “importante e transversal” a qualquer estação do ano.
Além disso, o protetor solar deve ser aplicado “mesmo que fiquemos em casa”. Nos locais fechados, há a luminosidade ambiente, conhecida como luz visível, que pode causar complicações, como manchas, envelhecimento precoce e queimaduras, esclarece Luís Uva.
O dermatologista da Personal Derma recomenda que o produto seja reaplicado ao longo do dia, visto que “a eficácia vai diminuindo”. Vera Leitão acrescenta que deve ser reaplicado mesmo em casa, “principalmente”, se a pessoa “usar muito” o computador ou outros ecrãs ou se estiver “muito perto das janelas”.
A dermatologista do Hospital de Loulé sugere que se “retoque” a proteção com outros produtos cosméticos, como “pós, brumas ou mousses com SPF incorporado”. Ou seja, “o importante é reaplicar”.
As consequências a curto prazo da não utilização de proteção solar “dependem” da exposição e do fototipo de cada indivíduo, refere Vera Leitão. Contudo, exemplifica, pode provocar eritema (vermelhidão), prurido, xerose (pele seca), e posteriormente dilatação de vasos sanguíneos superficiais e manchas.
A longo prazo, refere a médica, pode provocar “lentigo solar e queratoses actínicas” e, eventualmente, conduzir ao desenvolvimento de cancro da pele.
No momento da compra do protetor solar, deve-se escolher um produto que ofereça proteção contra as radiações UVA e UVB e que tenha FPS superior a 30, recomenda Luís Uva. Além disso, sugere, deve ser apropriado à idade e ao tipo de pele (oleosa, mista ou seca).
A professora da Faculdade de Medicina e Ciências Biomédicas da Universidade do Algarve acrescenta que se deve ter em conta diagnósticos dermatológicos anteriores, como acne, rosácea, dermatite seborreica, eczema atópico e queratoses actínicas.
“Existem protetores solares específicos para várias patologias e vários tipos de pele”, refere Vera Leitão.
Além disso, destaca que a proteção solar “não engloba só” o uso de creme ou produto cosmético com proteção solar. “Também se recomenda vivamente o uso de chapéu e óculos de sol”, indica.
Em declarações anteriores ao Viral, a farmacêutica Marta Ferreira tinha explicado que o FPS – número que é obrigatório aparecer nas embalagens, como 30 ou 50+ – corresponde ao tempo que o produto consegue manter a pele protegida.
Por exemplo, exemplificou, se a pele de uma pessoa demorar 10 minutos a ficar vermelha com a exposição solar, ao colocar um protetor com SPF 30, é suposto que aguente 300 minutos sem queimar, ou seja, 30 vezes mais tempo do que sem proteção.
Nas mesmas declarações, a autora do “Livro da Pele” recomendou a escolha de um produto com proteção UVB mínima de 30. Em “peles mais clarinhas, que queimam rápido” a recomendação é de “50 ou 50+”, acrescentou.
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