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“Engravidar de menina”: Método caseiro para “escolher” o sexo do bebé funciona?

7 Ago 2024 - 09:27

“Engravidar de menina”: Método caseiro para “escolher” o sexo do bebé funciona?

Circulam vários vídeos no Tik Tok que, supostamente, ensinam os casais a “engravidar de menina” ou de “menino”. Na base destas técnicas para “escolher” o sexo do bebé está o dia em que o casal tem relações sexuais.

“Vou contar-vos como consegui engravidar da minha menina”, começa por dizer a autora de um dos vídeos, exibindo a sua bebé ao colo. A explicação aparece mais adiante: “Não tem nenhuma fórmula mágica. Tem de saber exatamente o dia em que vai ovular” e ter relações sexuais “três dias antes da ovulação”.

Porquê três dias antes? Porque, alegadamente, o espermatozoide que leva os cromossomas X (feminino) “é mais lento” e “mais resistente”, enquanto que o que tem o cromossoma Y (masculino) é “mais rápido, mas não é resistente”, alega-se no vídeo.

“Se [tiver relações sexuais] três dias antes da ovulação, a probabilidade de vir uma menina é grande porque [o espermatozoide] consegue, no 14.º dia [dia da ovulação], ter sobrevivido e, finalmente, consegue implantar no óvulo”, defende a autora do vídeo.

Este não é um exemplo único: além dos vídeos que dão “dicas” para “engravidar de menina”, outros há que apresentam a técnica ao contrário, promovendo que o feto seja do sexo masculino.

“Para engravidar de menino, você precisa de manter relação no seu dia fértil”, afirma-se noutro vídeo de Tik Tok. Neste vídeo é também explicada a fórmula para identificar qual o dia da ovulação, contando a partir do último dia da menstruação anterior. 

Mas serão estas técnicas eficazes? É possível “escolher” o sexo do bebé através do dia em que se tem relações sexuais? O que diz a ciência sobre estas “dicas”?

Engravidar de menina ou de menino: É possível “escolher” o sexo do bebé com base no dia da relação sexual?

As técnicas descritas nestes vídeos têm por base o Método Shettles. Este método foi desenvolvido pelo ginecologista e obstetra norte-americano Landrum B. Shettles, na década de 1960, mas tem sido contestado desde então, não havendo evidência científica que o prove.

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O ginecologista que criou este método afirmava que os espermatozoides que carregam a informação genética que irá criar o sexo do bebé, nomeadamente os cromossomas X ou Y, têm formas e tamanhos diferentes e reagem de forma díspar ao ambiente uterino – que pode sofrer alterações conforme a altura do ciclo menstrual.

Tal como se explica num texto da Universidade Estatal do Arizona, segundo o método de Shettles, “para produzir uma menina, os casais devem abster-se de ter relações sexuais dois ou três dias antes da ovulação. Antes disso, as relações sexuais são aconselhadas, uma vez que o tempo entre o final da menstruação e pelo menos três dias antes da ovulação é quando as mulheres são mais prováveis de ser produzidas”, pode ler-se 

Por outro lado, de acordo com o mesmo método, “para produzir um menino, os casais devem abster-se de ter relações sexuais desde o início do ciclo menstrual até ao dia da ovulação”.

No mesmo texto explica-se que o criador deste método defende que “o dia da ovulação, assim como os seguintes dois a três dias, são quando as hipóteses de produzir um menino são mais elevadas”.

Além do dia da conceção, o método de Shettles também aconselha a realizar outros procedimentos antes das relações sexuais – como, por exemplo, a mulher banhar-se numa solução com vinagre, caso deseje ter uma menina, ou com bicarbonato de sódio, se quiser um menino – para potenciar o ambiente mais aconselhado à manutenção dos espermatozoides mais desejados.

Desde que foi publicado em livro, o método de Shettles tem sido contestado em vários estudos e por diferentes investigadores.

Teresa Almeida Santos, especialista em medicina de reprodução no Centro Hospitalar Universitário de Coimbra e professora na Faculdade de Medicina da Universidade de Coimbra, explica ao Viral que “nada disto funciona” e que a probabilidade de conceção de um bebé do sexo feminino ou masculino é de 50%.

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“Estas técnicas não têm qualquer base de veracidade. O que dá o sexo aos bebés é o cromossoma X ou Y – metade dos espermatozoides tem X e outra metade tem Y”, explica a especialista.

Sobre a alegação de que os espermatozoides que transportam o cromossoma Y são mais rápidos, Teresa Almeida Santos baseia-se na ciência para negar essa afirmação. Vários estudos – como este, publicado em 2016, e este, em 2020 – afirmam que não existem diferenças na morfologia dos espermatozoides que carregam diferentes cromossomas.

“Ao selecionarmos os espermatozoides mais rápidos, nada garante que só iremos encontrar cromossoma Y. Pode haver uma fração enriquecida em cromossoma Y, mas isso não quer dizer que não haja cromossoma X”, esclarece.

Além disso, ser o facto de um espermatozoide ser o mais rápido não significa necessariamente que será este a atingir o óvulo e a fecundá-lo. A velocidade é importante para o processo de fecundação, mas, tal como explicamos neste artigo do Viral, há outros fatores – tais como a mobilidade do espermatozoide – que têm influência na hora da conceção.

Questionada sobre as alegações de que os espermatozoides X são mais resistentes, Teresa Almeida Santos volta a dizer que “não há evidência” que o comprove.

“Os espermatozoides podem manter-se vivos no teatro genital feminino vários dias, mas não há evidência de que os cromossomas tenham alguma relação com esta resistência”, sustenta.

Importa sublinhar que, segundo a lei portuguesa referente à procriação medicamente assistida, a escolha do sexo do bebé é proibida, sendo sujeita a punição com pena de prisão até dois anos ou pena de multa até 240 dias.

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Método Shettles é contestado em vários estudos

Existem alguns artigos científicos que confirmam e outros que refutam o método de Shettles, o que significa que não existe evidência científica robusta que garanta a eficácia destas técnicas.

Em 1979, um estudo publicado pelo The New England Journal of Medicine dava razão a Landrum B. Shettles, concluindo que o dia do ciclo menstrual da mulher em que é realizada a inseminação “leva a uma variação do rácio do sexo” do bebé.

Anos mais tarde, em 1991, uma meta-análise publicada pelo The American Journal of Obstetrics and Gynecology apresentava resultados contraditórios aos que estão na base do método de Shelttles. Os investigadores encontraram menos nascimentos do sexo masculino quando os pais tinham relações sexuais durante o período de ovulação.

“Apesar de existir um défice relativo estatisticamente significativo de nascimentos masculinos resultantes de conceções durante o período mais fértil do ciclo [da mulher], isso é insuficiente para permitir a seleção do sexo através do momento da relação sexual”, concluem.

Também em 1995, um estudo publicado no The New England Journal of Medicine garantia que não havia qualquer relação entre o sexo do bebé e o dia do ciclo menstrual em que foi concebido. 

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“Para efeitos práticos, o momento da relação sexual em relação à ovulação não tem influência no sexo do bebé”, garantem os investigadores depois de analisar 625 ciclos menstruais, que resultaram em 192 gravidezes.

Mais recentemente, vários estudos têm reafirmado que os espermatozoides que carregam diferentes informações genéticas não têm diferenças significativas ao nível “físico, químico e funcional”. Num artigo publicado em 2020, é afirmado que “a única diferença entre espermatozoides X e Y é o seu conteúdo de ADN”.

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Gravidez

7 Ago 2024 - 09:27

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