
O seu filho não come vários alimentos? Como lidar com a seletividade alimentar
O seu filho recusa determinados alimentos ou insiste em comer sempre o mesmo? É provável que esteja a enfrentar um período de seletividade alimentar. Mas até que idade essa fase é considerada normal? E a partir de quando pode indicar um problema mais sério? O Viral Check foi à procura de respostas e estratégias para os pais diversificarem a alimentação das crianças de forma natural e com o mínimo de stress possível.
Até quando a seletividade alimentar é apenas uma fase?
A rejeição de vários alimentos ou a aceitação de apenas um grupo restrito de opções é uma fase comum no desenvolvimento infantil entre os dois e os seis anos, começam por explicar ao Viral Leonor Figueiredo, nutricionista da Clínica Agita Kalorias com formação em nutrição pediátrica, e Paulo Dias, neuropsicólogo da infância e adolescência das Clínicas Alberto Lopes.
Aliás, um estudo publicado no International Journal of Eating Disorders, realizado na Holanda, detalha que a seletividade alimentar é um comportamento comum na infância, especialmente entre crianças em idade pré-escolar, mas que tende a diminuir com o passar dos anos.
“O primeiro sinal de seletividade alimentar pode ser a separação dos alimentos no prato com a escolha de comer primeiro – ou apenas – aqueles que lhes parecem mais familiares e agradáveis”, refere a nutricionista consultada pelo Viral.
Um artigo de revisão publicado na Acta Portuguesa de Nutrição concluiu que os aspetos biológicos, psicológicos, sociais, culturais e económicos, além da introdução alimentar, das práticas parentais e da influência do marketing são os principais fatores que influenciam o desenvolvimento das preferências alimentares e da seletividade alimentar em crianças.
Segundo Leonor Figueiredo e Paulo Dias, a neofobia alimentar – o medo de experimentar novos alimentos – é um dos principais fatores da seletividade alimentar.
Além disso, experiências negativas que possam ter ocorrido quando a criança experimentava ou comia algum alimento, podem levar a uma recusa persistente.
Algumas crianças também apresentam hipersensibilidade sensorial às texturas, cheiros e aos sabores dos próprios alimentos.
Por outro lado, a rejeição alimentar pode ser uma forma de afirmação de independência, especialmente numa fase em que as crianças começam a testar limites e a expressar preferências próprias.
Quais os sinais de alerta?
Se a criança estiver a crescer de forma saudável, não há motivo de preocupação. No entanto, e apesar de alguma seletividade alimentar ser “normal” até aos seis anos, os especialistas consultados pelo Viral salientam que os pais devem estar atentos à persistência desse comportamento e à forma como pode estar a afetar negativamente o crescimento ou o peso da criança.
Se os alimentos aceites são tão poucos “que podem ser contados com os dedos de uma mão”, e se a criança recusa completamente um grupo alimentar, como “legumes, frutas ou lacticínios”, é importante ficar alerta, sublinha Leonor Figueiredo.
Outro sinal preocupante é a “recusa de qualquer alimento que não tenha uma textura específica, como crocante ou pastosa”, acrescenta ainda Leonor Figueiredo.
A seletividade alimentar pode também tornar-se um problema quando impacta negativamente a vida social da criança ou causa elevados níveis de stress e ansiedade durante as refeições, aponta o neuropsicólogo.
Como incentivar uma alimentação variada, mas sem pressão?
Lidar com a seletividade alimentar requer paciência, persistência e, acima de tudo, estratégia, esclarecem os especialistas.
Criar um bom ambiente durante as refeições, introduzir alimentos sem tornar isso num momento de conflito e respeitar o tempo da criança é essencial neste processo.
Segundo as Normas de Orientação para uma Alimentação Saudável dos 0 aos 6 anos, publicadas pela Direção-Geral da Saúde (DGS), é de extrema importância uma dieta equilibrada e variada, incluindo a introdução de novos alimentos de forma gradual e sem pressão, para prevenir a seletividade alimentar e promover hábitos alimentares saudáveis desde cedo.
Apesar de “não existirem fórmulas mágicas para uma solução rápida e eficaz”, os pais devem estabelecer uma rotina de refeições consistentes e com horários regulares, para evitar que a criança recuse os alimentos por estar sem fome ou satisfeita com os lanches”, assinala o neuropsicólogo Paulo Dias, alertando para o erro de incentivar repetidamente a ingestão de alimentos através da atribuição de recompensas.
Leonor Figueiredo alerta que “as crianças aprendem por imitação e os pais são o espelho das suas preferências, por isso, é fundamental dar o exemplo”. Comer em família, demonstrar prazer e ter uma alimentação variada pode ser uma boa estratégia para incentivá-las a provar novos alimentos.
Além disso, elogiar a comida de forma natural e entusiasmada pode despertar a curiosidade dos mais novos.
Outra sugestão passa por envolver os filhos no processo de escolha e preparação da comida. Deixar que escolham alguns ingredientes no supermercado, incentivá-los a participar na confeção das refeições e até montar o próprio prato.
Manter sempre no prato o alimento rejeitado, mas sem exigência para comer, pode ser outra forma de contornar a seletividade alimentar.
“Para que um novo alimento seja aceite, pode ser necessário oferecê-lo várias vezes – entre 6 e 15 exposições -, num processo chamado familiarização alimentar, onde o alimento fica visível e à disposição no prato, mas sem que exija uma obrigação”, salienta Leonor Figueiredo.
Para Paulo Dias, a criatividade dos pais também pode ser uma aliada. “As crianças tendem a ter uma excelente imaginação. Apresentar os alimentos de forma criativa pode torná-los mais atrativos”, destaca o neuropsicólogo.
Na mesma linha de ideias, o guia Dúvidas, Problemas e Dificuldades na alimentação do seu filho, da Associação Portuguesa de Nutrição, deixa vários exemplos, tais como: dar nomes criativos aos pratos, como “Arroz de Peixe à CR7”, ou recorrer a personagens de desenhos animados ou heróis que a criança admire, dizendo que eles são fortes, porque incluem na sua dieta o alimento que, geralmente, é recusado.
A mesma associação refere, também, que uma das soluções para lidar com as birras passa por não dar demasiada atenção na primeira vez que ocorrerem e permitir que a criança expresse sua frustração sem ceder imediatamente.
Caso a situação persista, deve ser mantida uma postura firme e que não satisfaça todas as vontades da criança.
Quando procurar ajuda profissional?
Se a dificuldade persistir e começar a afetar a saúde ou o crescimento, os especialistas consultados pelo Viral recomendam procurar suporte médico para ajudar a criança a construir uma relação saudável com os alimentos e, por outro lado, orientar os pais sobre a melhor abordagem para lidarem com a situação.