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Amamentar ou não amamentar? Benefícios e mitos sobre aleitamento materno

É dos temas que causa mais ansiedade às mães: o aleitamento materno. Muitas mulheres debatem-se com dúvidas sobre os benefícios da amamentação, pensam que não têm leite suficiente para o bebé e questionam-se sobre por quanto tempo devem amamentar. Afinal, um bebé pode crescer saudável alimentado apenas com o leite da mãe?

31 Dez 2022 - 08:00

Amamentar ou não amamentar? Benefícios e mitos sobre aleitamento materno

É dos temas que causa mais ansiedade às mães: o aleitamento materno. Muitas mulheres debatem-se com dúvidas sobre os benefícios da amamentação, pensam que não têm leite suficiente para o bebé e questionam-se sobre por quanto tempo devem amamentar. Afinal, um bebé pode crescer saudável alimentado apenas com o leite da mãe?

A Organização Mundial da Saúde (OMS) e a UNICEF recomendam o aleitamento materno em exclusivo até aos seis meses de vida do bebé, o que significa que nenhum outro alimento ou líquido deve ser oferecido durante esse período. As duas organizações internacionais indicam que a amamentação deve ser sob demanda, ou seja, sempre que o bebé quiser e a qualquer hora do dia, e desaconselham oferecer à criança biberões, tetinas ou chupetas.

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Aliás, a OMS e a UNICEF criaram em 1991 um programa mundial de promoção do aleitamento materno intitulado Iniciativa Hospitais Amigos dos Bebés que, segundo a Comissão Nacional da Iniciativa Amiga dos Bebés, já acreditou 15 instituições em Portugal como sendo Amigas dos Bebés por promoverem o aleitamento materno

Contudo, apesar destas recomendações, ainda persistem algumas dúvidas, mitos e ideias pré-concebidas sobre o aleitamento materno, também chamado de lactação, que deixam as mães ainda com mais ansiedade num momento tão desafiante como é o nascimento de um filho.

Conhecedora dos desafios que surgem nessa altura da vida do casal por ser médica e também por ter sido mãe há pouco mais de um ano, Nádia Sepúlveda, médica de família no Aces de Braga, aborda as questões da parentalidade na página de Instagram com mais de 54 mil seguidores e dedica especial atenção ao tema da amamentação. Em declarações ao Viral, a especialista desconstrói alguns mitos que ainda persistem sobre esta matéria.

Afinal, quais são os benefícios da amamentação para a mãe?

Por vezes, a sociedade foca-se em enumerar os benefícios do aleitamento materno para o bebé deixando para segundo plano as vantagens que tem para a mãe e “a verdade é que há benefícios para ambas as partes”, garante Nádia Sepúlveda.

A amamentação começa por ser protetora dos chamados baby blues e da depressão pós-parto, situações que afetam algumas mulheres e estão muito associadas às alterações hormonais decorrentes do parto, ao cansaço, às alterações de rotina, à privação de sono e a toda uma multiplicidade de emoções que acompanha a mulher após do parto.

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Depois, sublinha a médica de família, o aleitamento materno “ajuda na conexão com o bebé, é algo biológico e preparado precisamente para ajudar a criar o vínculo com o bebé”. Afinal, lembra a especialista, “o amor materno não é uma coisa instantânea de filme, varia muito de pessoa para pessoa, e a conexão entre a mãe e o bebé muitas vezes não acontece durante a gravidez ou logo no momento do nascimento, é um processo que vai acontecendo e a amamentação pode ajudar”.

A lactação também “ajuda a toda a recuperação em termos uterinos, a normalizar o peso e, do ponto de vista hormonal, acaba por ser a consequência lógica de um organismo que acabou de passar por um processo de parto”.

Depois, existem benefícios para a mulher a longo prazo que têm sido demonstrados pela investigação científica, com vários estudos a comprovarem que a amamentação “diminui o risco futuro de desenvolvimento de doenças cardiovasculares, nomeadamente enfartes e acidentes vasculares cerebrais, de cancro de mama”, assim como de cancro de ovário e de diabetes mellitus tipo 2.

E quais as vantagens do aleitamento materno para o bebé?

Um bebé alimentado com o leite da mãe fica mais protegido contra a asma, a obesidade, a diabetes mellitus tipo 1, as infeções respiratórias e contra a síndrome de morte súbita. Amamentar os bebés imediatamente após o nascimento pode reduzir a mortalidade neonatal, aquela que acontece até o 28º dia de vida.

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Nádia Sepúlveda explica que, “nutricionalmente, o leite produzido pela mãe é o mais equilibrado para aquele bebé em específico, é único, um alimento vivo que se adapta e adequa às necessidades do bebé. Por exemplo, se a mãe está a amamentar e fica com gripe, vai produzir os anticorpos para transmitir ao bebé no leite, como se fosse uma vacina”.

A composição do leite materno tem ainda hormonas importantes para o bebé regular o sono, sendo que o ato de sucção no mamilo é aquele que dá maior sensação de conforto, importante para ajudar a acalmar e a adormecer. Por esse motivo, a ideia de que o bebé amamentado pela mãe dorme pior também “não faz qualquer sentido”. 

Até porque, explica a médica de família, “a composição do leite da mãe varia ao longo do dia, para se adaptar às diferentes necessidades do bebé a cada momento do dia”, o que faz com que o leite da manhã seja diferente do da noite.

A questão é que “os bebés não vão dormir muito tempo seguido, acordam várias vezes porque ainda estão a aprender a autorregular-se, são mecanismos de defesa que são chatos para os pais e geram muito cansaço, mas não está relacionado com o facto de o bebé não estar a receber alimento suficiente da mãe”, explica Nádia Sepúlveda.

Outra vantagem do aleitamento materno é que facilita a regulação da saciedade por parte do bebé. Como as tetinas dos biberões são de sucção contínua torna-se mais difícil para o bebé aprender a regular o apetite do que se for alimentado ao peito, onde o leite só saí se ele mamar. 

As tetinas dos biberões, e também as chuchas, são igualmente prejudiciais ao desenvolvimento das estruturas orofaciais – língua, músculos e dentes – pois ainda não foram desenvolvidos acessórios que imitam o mamilo da mulher na perfeição, onde o ato de sugar do bebé “é muito mais fisiológico”.  

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Existe leite materno fraco?

“Não dou de mamar porque o meu leite é fraco”. Esta ainda é uma frase muito ouvida, sobretudo nos momentos a seguir ao parto, quando o que a mãe produz é colostro, um leite amarelado e grosso, típico dos primeiros três a cinco dias a seguir ao nascimento. Contudo, este é, precisamente, o alimento ideal para um recém-nascido por ser muito nutritivo e ajudar a proteger o bebé de infeções, daí que a recomendação seja amamentar o bebé na primeira hora após o parto.

Nádia Sepúlveda garante que “uma mulher saudável, que nutricionalmente esteja bem equilibrada, vai conseguir produzir leite suficiente para o seu bebé, nutricionalmente adequado para ele, com os benefícios que conhecemos” e frisa que o conceito de leite fraco nasceu do marketing da indústria alimentar aquando do aparecimento dos leites de fórmula.

Ainda assim, “estima-se que entre 10% a 15% das mulheres não consigam produzir leite suficiente por terem algum problema ao nível do tecido mamário, como uma hipoplasia mamária, mas a esmagadora maioria das mulheres não tem qualquer problema e produz leite suficiente e de qualidade para o bebé”, explica a médica de família. 

O que pode acontecer é, por não estar a ser devidamente estimulada, “por falta de confiança da mãe ou por problemas na pega do bebé”, a produção de leite ser insuficiente para o bebé e, nesses casos, a médica de família aconselha a procurar ajuda junto de profissionais que possam esclarecer dúvidas e aprender a fazer uma pega correta.

A dor na amamentação é normal?

“Sem dúvida que quando há dor é porque algo não está a correr bem”, diz Nádia Sepúlveda, contrariando a ideia de que a amamentação é dolorosa.

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Se a mulher sente dor durante a lactação, os motivos podem estar relacionados com ela ou com o bebé. Da parte do bebé, este pode ter alguma alteração orofacial que o impeça de mamar corretamente, pode estar a fazer uma pega mal direcionada, “em que não está a abocanhar o suficiente e está a ser superficial”, causando desconforto à mãe.

Da parte da mãe, os problemas funcionais da estrutura da mama, como alterações na vasodilatação e vasoconstrição das artérias da mama que fazem com que o reflexo de ejeção do leite seja muito intenso e provoque dor, o entupimento dos ductos da mama, fissuras nos mamilos ou feridas e ulcerações estão entre as principais causas de dor durante a amamentação.

Também podem ocorrer infeções fúngicas que afetam a mama, como a candidíase mamária, ou mastites, que podem resultar de infeções bacterianas.

O conselho é, perante um quadro de dor durante a amamentação, investigar as causas e tratar porque “são situações facilmente resolvidas com o devido apoio, sendo possível manter a amamentação”, garante a especialista em Medicina Geral e Familiar.

E desengane-se quem pensa que tomar antibiótico, os fármacos utilizados para tratar infeções bacterianas, é incompatível com a amamentação porque “quase todos os de primeira linha, e até mesmo de segunda linha, são compatíveis com o ato de amamentar”, assegura a médica. 

A alimentação da mãe provoca cólicas no bebé?

“Era bom que assim fosse, porque assim resolveriamos a questão mais facilmente”, diz a médica de família. As cólicas do lactente podem ter múltiplas causas, desde a deglutição excessiva de ar durante a mamada, à imaturidade gastrointestinal ou à tensão emocional do bebé que ainda está a descobrir como é estar fora do útero da mãe.

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“O que sabemos é que bebés que não tenham alergia a proteína do leite de vaca ou a outros alergénios, como frutos secos, não vão beneficiar de a mãe evitar certo tipo de alimentos”, assegura a médica de família, que recomenda apenas que a mãe opte por uma alimentação saudável. 

Faz sentido suplementar a mãe para aumentar a produção de leite?

“Em termos de evidência científica não. Há suplementos que prometem aumentar a produção de leite, mas não temos evidência científica de que isso funcione”, garante a médica de família.

Segundo a explicação de Nádia Sepúlveda, a regulação da produção de leite “está mais relacionada com ter o bebé a sugar o mamilo do que com qualquer outra coisa que possamos imaginar”, ou seja, é o próprio bebé que vai fazer a mãe produzir mais ou menos leite, consoante as necessidades.
Em casos menos comuns em que a mãe esteja mal-nutrida no pós-parto, pode fazer sentido dar algum suplemento com os nutrientes que estejam em falta, mas, de uma maneira geral, “não são as vitaminas ou os suplementos que vão ajudar na produção de leite ou a torná-lo mais nutritivo”.

A única recomendação da Direção-Geral da Saúde para o período da amamentação é manter o suplemento de iodo – cuja carência pode levar a alterações cognitivas na criança – recomendado durante a pré-conceção e gravidez, estendendo durante o período em que a mãe amamenta. 

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A partir de 12 meses o leite da mãe é dispensável?

Outra questão muito frequente é até quando a mulher deve amamentar o bebé. O recomendado pela OMS e UNICEF é que a amamentação possa ser prolongada até aos dois anos ou mais. A médica de família diz que “o bebé pode mamar até continuar a fazer sentido para ele e para a mãe, sendo que biologicamente até faz sentido mamar até mais tarde do que vemos atualmente”, mesmo depois da introdução da alimentação sólida.

A ideia de que “o leite materno deixa de ter benefícios e passa a ser água não é correta, porque ao longo do tempo o leite materno mantém nutrientes – continuando a ter imensa vitamina C, mantendo o teor de proteína e de ómega-3 – para suprir as necessidades do bebé”, explica a médica de família

A especialista volta a reforçar que o ideal é o aleitamento materno em exclusivo até aos seis meses e o leite deve continuar a ser o “principal alimento até aos 12 meses, seja materno ou de fórmula, sendo a alimentação sólida um complemento”. 

Para lá desse período, a continuação da amamentação deve ser ponderada tendo em conta a capacidade de autorregulação do bebé e a decisão da mãe.

“A sociedade tem muita pressa, precisa de ir com mais calma e respeitar os sinais do bebé”, conclui.

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31 Dez 2022 - 08:00

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